Entenda o que é oniomania, a compulsão por compras

Desde outubro de 2020, a população brasileira tem experimentado uma nova forma de pagamento, o Pix. Contudo, a vendedora Luciana do Rocio Mallon, de 49 anos, até hoje não aderiu a ferramenta. O motivo? Ela tem medo de que ter uma chave Pix a faça gastar compulsivamente com compras na internet.

Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 8% da população mundial sofre de oniomania, ou Transtorno de Comprar Compulsivo (TCC), popularmente conhecida como compulsão por compra. Luciana é uma dessas pessoas, ela percebeu que algo estava errado quando viu que não conseguia fechar os armários abarrotados de roupas, visto que toda vez que saía de casa, voltava com algo novo. Porém, para ela, o transtorno só ganhou nome em 2020, quando iniciou um tratamento on-line.

“Quando eu tentei parar de comprar, a depressão e ansiedade atacaram de vez (...). Na época da pandemia, várias ONGs ofereceram tratamento virtual com psicólogas. Consultei algumas naquela época e elas falaram que minha compulsão por compras era uma forma nociva de preencher áreas da minha vida que estavam confusas”, diz Luciana.

Hoje, a vendedora continua com as terapias on-line, mas também frequenta um grupo presencial de neuróticos anônimos. “Minha compulsão não é por bebida e nem por drogas, mas é por compras. Ela começou em meados dos anos 1990, quando passei a trabalhar fora e piorou em 2018, quando comecei a dar aulas de dança, pois precisava sempre comprar figurinos para as apresentações. Hoje, está mais controlada, mas tenho medo de ter Pix e gastar com produtos na internet. Às vezes, quando estou andando na rua e vejo a palavra liquidação, isso me causa uma espécie de excitação que estou tentando controlar”, relata.

Oniomania, a compulsão por compras
Segundo a psicóloga Regina Elena, professora da Estácio, comprar desnecessariamente e em excesso sem considerar as consequências são indícios de que algo está errado e precisa ser acompanhado. Dentre as principais características do transtorno, ela destaca a alternância entre os sentimentos de prazer e culpa.

 “Inicialmente, ao comprar, a pessoa experimenta a sensação de prazer. Há a liberação de endorfina e os sistemas de compensação são acionados. Perde-se a referência da intensidade e da frequência com que essas compras são feitas. O indivíduo perde a capacidade de refletir de maneira adequada sobre as suas reais necessidades. É o mesmo processo do consumo excessivo de bebidas, cigarros e automutilação. Esse indivíduo passa a ter o comportamento de um dependente químico. É fissura mesmo. Ele compra, vem o arrependimento, ele então precisa comprar novamente para ativar as recompensas e sensação de prazer e na verdade, vai adoecendo mais”, explica.

Causas da compulsão por compras
De acordo com o psicólogo Marcelo Alves, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, as causas que levam à oniomania são diversas e cada pessoa pode ter um motivador diferente. Contudo, diz ele, algumas situações são recorrentes.

“As situações mais comuns que podem levar uma pessoa a desenvolver a oniomania incluem traumas da infância, insegurança, privação emocional na infância, incapacidade de tolerar sentimentos negativos, perfeccionismo exagerado, necessidade de aprovação coletiva, busca incessante pelo prazer e perda significativa na vida da pessoa”, comenta Marcelo.

O professor esclarece que o tratamento do transtorno envolve terapia com psicólogo e psiquiatra. Além disso, destaca, é preciso que a pessoa queira se tratar, bem como que ela aprenda a fazer um controle financeiro.

“A principal consequência da oniomania é o comprometimento financeiro, se a pessoa não for bem tratada ela vai entrar em falência.  A segunda questão envolve os relacionamentos”, alerta Marcelo.

Para prevenir as compras por impulso ou mesmo evitar que a pessoa em tratamento de oniomania caia em tentação, os profissionais destacam a necessidade do envolvimento da família e amigos para ajudar que a pessoa não se exponha às situações que a levem às compras.

“É importante reduzir a exposição da pessoa às compras, evitando shoppings, cancelando cartão de crédito, entre outros. A partir do tratamento psicoterápico é preciso fazer uma planilha para que a pessoa possa entender o que ela está comprando, pois o oniomaníaco chega quase a um acumulador, pois por vezes ele tende a comprar vários itens da mesma coisa”, ressalta o professor.

Fique de olho
A compulsão por compras é algo sério e pode trazer consequências graves para a vida de quem convive com o transtorno e também para seus familiares. Assim, vale prestar atenção em alguns comportamentos e ao notá-los procurar ajuda.

 A seguir, veja algumas situações que ao responder sim, devem fazer com que a pessoa ligue o alerta, de acordo com Marcelo Alves.

“A minha privação emocional ou meu rompimento em algum relacionamento me levou a consumir mais e eu não consigo diminuir mais o ritmo de compra?”;

“Como eu lido com os sentimentos negativos? Eles me impulsionam a comprar e a comprar cada vez mais, mesmo em quantidades elevadas de produtos que eu não preciso?”;

“Estou descarregando os meus sentimentos e o meu prazer em compras?”;

“Eu preciso comprar para me sentir bem e feliz?”;

“Estou me sentindo solitário e acabo preenchendo isso com compras?”;

“Minha autoestima é afetada por uma compra, mas logo a sensação passa e eu preciso comprar novamente?”;

“Minha vida financeira está comprometida porque tenho comprado demais?”.

Leia esta matéria também na Gazeta de S. Paulo.