mauricio_de_souza / Valter Campanato/Agência Brasil
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As próximas histórias da "Turma da Mônica" não estão escritas nos gibis. Embora a equipe de Mauricio de Sousa ainda produza nada menos do que 800 páginas de quadrinhos todo mês para oito revistas, o carro-chefe de seu estúdio agora são filmes e séries, com desdobramentos também nos teatros.
A empreitada surgiu depois da experiência bem-sucedida com "Laços" e "Lições", os filmes que deram carne e osso a Mônica, Cebolinha, Magali e Cascão. São os longas que precedem "Turma da Mônica - A Série", que estreia nesta quinta-feira no Globoplay e finaliza a trajetória do primeiro elenco que deu vida à garotada do bairro do Limoeiro.
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A despedida, no entanto, não é amarga, já que os live-actions, como são conhecidos os filmes com atores, abriram as portas para uma infinidade de obras audiovisuais. Uma das próximas a estrear é a série "Franjinha e Milena em Busca da Ciência", que chega ao catálogo da HBO Max em dezembro.
Ela, no entanto, é só um aperitivo do banquete que a Mauricio de Sousa Produções, a MSP, está preparando, diz Marcos Saraiva, produtor-executivo à frente do núcleo audiovisual do estúdio.
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Nos planos para o futuro próximo estão ainda um filme sobre Chico Bento, que deve começar a ser gravado nos próximos meses, assim que o elenco for escolhido, e uma série do personagem Jeremias adaptada da graphic novel "Jeremias: Pele", que venceu o prêmio Jabuti com um retrato "do dia a dia de um preto no Brasil, um país racista, ao estilo de 'Todo Mundo Odeia o Chris'", nas palavras de Saraiva, filho de Mônica e neto de Mauricio de Sousa.
Para o futuro mais distante, há cinco filmes da "Turma do Penadinho", que voltaram a ser planejados depois de uma paralisação durante a pandemia a pedido de Mauricio de Sousa, que acreditava ser inoportuno tratar do tema morte à época.
As histórias dos personagens principais também vão ter continuidade. Um novo elenco, com atores na faixa dos 20 anos, já foi escolhido para uma série de quatro filmes da "Turma da Mônica Jovem", que devem ser lançados nos cinemas ano a ano a partir de 2022.
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A troca dos atores se deu porque, além de não querer esperar até que as crianças de "Laços" e "Lições" crescessem o suficiente para interpretar a turma jovem, o estúdio tampouco quer seus protagonistas vinculados a um mesmo ator, como visto em "Os Vingadores", por exemplo.
Reproduzir o modelo da Marvel seria um risco, diz Saraiva, por múltiplos fatores, entre eles o alto cachê que os atores podem cobrar conforme ficarem famosos e o risco de um ou outro se recusar a seguir interpretando os personagens, o que, lá fora, já ameaçou a continuidade de franquias como "Harry Potter".
É pelo mesmo motivo que daqui a dois ou três anos a própria "Turma da Mônica" clássica, em sua versão infantil, deve passar por um "reboot" e ganhar uma segunda vida nas telas na pele de outras crianças, num movimento que Saraiva compara ao que já acontece no Brasil com "Detetives do Prédio Azul".
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As animações, caso o leitor esteja se perguntando, não vão ficar para trás. Em outubro, "Vamos Brincar", uma série voltada a crianças de três a cinco anos, deve estrear no Gloob, enquanto o personagem Astronauta vai ganhar uma série na HBO Max, voltada ao público adulto.
"A 'Turma da Mônica' pega de zero a 99 anos, porque ela passou na vida de pessoas de zero a 99 anos, mas não temos conteúdos para todas as idades. Este é o nosso objetivo hoje, ter obras para cada faixa etária", diz Saraiva.
É com essa estratégia em mente que Mauricio de Sousa já ventila a possibilidade de uma "Turma da Mônica" adulta, um projeto que deve ser criado primeiro para as páginas, mas que, se for bem-sucedido, não deve escapar das telas.
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"O país mais adiantado na produção de entretenimento para idosos é o Japão, então estou conversando com amigos de lá para ver o que dá para fazer no Brasil. A gente está vivendo cada vez mais, curtindo a vida por cada vez mais tempo. Precisamos dar uma boneca e uma bola para o idoso", diz, entre risos.
Diferente do que a Marvel faz com a Disney e com a Sony, ou o que a DC faz com a Warner, a ideia da MSP não é fazer com que personagens de diferentes histórias se cruzem numa mesma obra como "Os Vingadores".
"Diferente de nós, a Marvel banca tudo, da produção à distribuição, então eles têm um planejamento mais claro. Como a gente trabalha com parceiros diferentes, um universo compartilhado é inviável", diz Saraiva.
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"Além disso, o Mauricio sempre quis os personagens onde o público está. Se escolhêssemos trabalhar com um streaming ou um canal só, a gente limitaria a vida deles. O ideal é ter conteúdo para todas as plataformas."
Por trás desta estratégia não estão só a bilheteria dos cinemas ou quanto um streaming pode pagar para pegar um personagem emprestado, mas a capacidade de impulsionar a internacionalização do estúdio, já que as obras, no streaming, podem apresentar o público estrangeiro à "Turma da Mônica", e alavancar a venda de produtos licenciados.
Com a retração do mercado editorial, hoje, mais do que os gibis, as histórias contadas nas telas fortalecem o vínculo afetivo das crianças com os personagens e as levam a um maior potencial de compra.
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Das maçãs da Mônica e o molho de tomate do Jotalhão aos xampus para cabelos crespos e ondulados de Milena, o licenciamento é o que mais dá lucro para a MSP. Hoje, são mais de 4.000 produtos da "Turma da Mônica" disponíveis nas prateleiras, feitos por 200 empresas de quase 20 segmentos.
Uma das principais parceiras do estúdio para o setor alimentício, a Fischer, por exemplo, vendeu no ano passado mais de 217 milhões de maçãs, o que poderia encher 180 vagões de um trem de carga dispostos numa fila de três quilômetros, o suficiente para saciar até mesmo a fome de Magali.
Também fruto do licenciamento, há os parques temáticos –um deles instalado no shopping SP Market, em São Paulo, com ingressos que vão de R$ 80 a R$ 299, e o outro a ser inaugurado às vésperas do Dia das Crianças em Gramado, no Rio Grande do Sul.
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O vínculo afetivo do público também é reforçado nos teatros, que envolvem custos tão altos quanto os de um filme –um dos últimos espetáculos, por exemplo, demandou R$ 6,5 milhões, que foram doados por empresas a Mauricio de Sousa por meio da Lei Rouanet.
"O teatro é uma maneira de as crianças inclusive conhecerem a 'Turma da Mônica'. Eu vejo na plateia bebês de poucos meses, adultos sozinhos e até idosos quase centenários", diz Mauro Sousa, um dos filhos de Mauricio, à frente das produções teatrais e dos parques temáticos.
Se, por um lado, os produtos licenciados são a maior fonte de renda e a principal aposta do estúdio, por outro são também uma fonte constante de estresse, diz Mônica Sousa, a filha de Mauricio que inspirou a franquia e hoje é diretora comercial da empresa. Isso porque, vira e mexe, surgem projetos de lei para proibir que personagens estejam em embalagens de produtos infantis.
"Para mim, isso é ditadura. É proibir os pais de decidirem o que querem dar aos filhos. A Mônica nunca vai vender nada, nunca vai dizer que tal coisa é gostosa, que vai ficar mais forte por ter comido algo. Nossos personagens não dão testemunho sobre produtos e também não misturamos publicidade com editorial", diz. "A gente precisa educar as pessoas, não proibir."
Se nada entrar no caminho da criançada do Limoeiro, a expectativa de Mauricio e sua equipe é transformar tinta e papel numa franquia audiovisual tão potente quanto as de Hollywood. "A criança é a mesma em todo lugar do mundo. No início, tinha receio de que nosso estilo gráfico e nosso humor não fossem funcionar, mas funcionou com os gibis. Por que não pode funcionar também com os filmes?"
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