SANTOS

Ministério Público recebe relatório de impacto da dragagem do Porto de Santos

Lama produzida afeta a fauna marinha, a vida de centenas de pescadores, familiares e à própria população

Carlos Ratton

Publicado em 15/05/2023 às 07:00

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Dragagem vem causando impactos negativos à natureza e prejudicando a atividade pesqueira, principalmente a artesanal / Divulgação

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O Ministério Público Federal (MPF) e o Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente (Gaema) Baixada Santista, do Ministério Público Estadual (MP-SP), já têm em mãos um relatório minucioso e realista sobre o impacto negativo que as constantes dragagens realizadas no canal do Porto de Santos e a lama produzida por elas vêm causando à pesca, principalmente à artesanal, comprometendo a fauna marinha e a saúde da população da Baixada Santista.

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O documento foi elaborado pelo Instituto de Pesca, através do Projeto Valoriza Pesca, e em parceria com a Área de Proteção Ambiental (APA) Marinha Litoral Centro. Ele é resultado de um levantamento realizado com pescadores e pescadoras de 23 localidades.

Ele foi assinado Cristiane Rodrigues Pinheiro Neiva, Ingrid Cabral Machado, Miriam Virgínia Lopes e Mayra Jankowsky, todas pesquisadoras do Departamento do Instituto de Pesca e do Projeto Valoriza Pesca, com participação de Ronney Peterson, representante dos pescadores artesanais da Baixada Santista.

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HISTÓRICO.

Conforme o documento, as queixas sobre a ocorrência de lama no mar não são uma novidade. Elas ocorrem há mais de uma década, porém se intensificaram a partir da execução da dragagem de aprofundamento do canal do Porto Organizado de Santos, realizada entre 2010 e 2020.

Os pesquisadores alertam ainda que, apesar de a problemática da lama, a região do estuário santista concentra um dos maiores polos industriais e o maior complexo portuário da América Latina, que carrega um histórico de mais de décadas relacionado à degradação ambiental e social, cujos impactos ainda refletem nos dias de hoje.

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DRAGAGEM.

No histórico do documento, lembram que a dragagem do canal é uma atividade contínua, que promove a retirada de sedimento do canal de acesso, bacias de evolução e berços de atracação da área portuária pública e terminais privados, com o objetivo de tornar o canal navegável, podendo visar o aprofundamento ou manutenção da profundidade do canal.

E que o sedimento dragado é descartado no mar, de acordo com a licença concedida pelo órgão ambiental competente, no Polígono de Disposição Oceânica (PDO), em uma área de 40 quilômetros quadrados.

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Informam que, conforme exigido nos processos de licenciamento ambiental, as diversas atividades de dragagem são monitoradas por meio de contratos terceirizados que realizam estudos sobre a produtividade pesqueira, avaliação da qualidade ambiental, modelagens de dispersão e avaliação de risco.

GUAIÚBA.

Os pesquisadores lembram que só no ano de 2012 ocorreu uma denúncia formal relativa ao impacto da lama na pesca, efetuada pela Associação dos Pescadores do Guaiúba (Guarujá), o que motivou a abertura do inquérito civil público pelo Ministério Público Federal (MPF).

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As reclamações incluíam aspectos como a presença de lama nas redes de pesca, a diminuição da produção pesqueira, o aparecimento de problemas de pele, redução do banco de mexilhões, entre outros.

Ao fim, a autoridade portuária custeou um estudo multidisciplinar, envolvendo especialistas, que concluiu não haver, na ocasião, evidências de relação causal entre as queixas dos pescadores e as atividades envolvidas na dragagem de aprofundamento do canal do Porto de Santos.

NA COSTA.

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Conforme relatados aos MPs Federal e Estadual, na Baixada Santista, o setor pesqueiro artesanal tem trazido, há mais de uma década, queixas relacionadas ao aumento da ocorrência de lama na costa, que, segundo os relatos, tornam a atividade de risco quanto à perspectiva de êxito, reduzindo a sua viabilidade econômica na região.

Esses volumes de lama na água do mar, reconhecidos como naturais enquanto ocasionais e típicos, passaram a ser tratados como eventos diferenciados e muito mais frequentes e danosos.

Mas, segundo afirmam, há registros fotográficos e em vídeos produzidos pelos pescadores por meio de telefones celulares, e enviados a instituições e instâncias gestoras para chamar a atenção sobre o problema e obter respostas e encaminhamentos que tragam, antes de tudo, explicações e perspectivas de mitigação.

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VALORIZA PESCA.

O projeto é fruto do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) da Ultracargo, firmado pós incêndio ocorrido na região da Alemoa em 2015, que gerou, dentre danos coletivos, um duro impacto à pesca artesanal.

O projeto vem sendo executado com o objetivo de gerar informações confiáveis sobre a atividade e estabelecer diálogos colaborativos, sob a premissa da escuta ativa para ampliar o espaço de fala de pescadores e pescadoras.

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Unifesp se reúne com pescadores artesanais da Baixada Santista

Paralelamente ao material enviado aos dois ministérios públicos, semana passada, o Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Campus Baixada Santista promoveu um encontro para compreender como os impactos ambientais sobre o sistema estuarino e demais territórios pesca estão atingindo o trabalho e a renda dos pescadores e como a determinante ambiental e social impacta a saúde deles.

Participaram lideranças da pesca artesanal de cidades da região, pesquisadores e estudantes da Unifesp, do Instituto de Pesca de Santos e operadores do Direito.

"Os relatos foram contundentes e reveladores no sentido de que tanto os empreendimentos que estão sendo implantados na região estuarina estão ocupando espaços tradicionais de pesca, como as dragagens para sua implantação e o aprofundamento e manutenção da dragagem impossibilita a regeneração ecológica do ambiente marinho", afirma o pesquisador da Unifesp, Jeffer Castelo Branco, que conduziu o encontro.

Branco revela que diversas espécies apresentem um declínio considerável em quantidade e qualidade. Fato que poderá ser agravado quando entrarem em operação com a descarga de efluentes que poderão estar fora dos parâmetros legais.

Também presente, o líder comunitário e secretário da Associação de Moradores e Amigos da Cachoeira, em Guarujá, Sidnei Bibiano Silva dos Santos, confirma o impacto da lama da dragagem na vida dos pescadores artesanais no Canal de Bertioga.

"Recentemente, tivemos 150 dias de dragagem de aprofundamento do canal e, cada vez que isso acontece, sedimentos são levantados e espalhados pelas correntezas das marés, prejudicando toda a vida marinha da região, inclusive do Canal de Bertioga, consequentemente contaminando as espécies, berçários marinhos e prejudicando a pesca artesanal e a sobrevivência dos comunidades que vivem dela".

Segundo Bibiano, existe cerca de 48 mil pescadores no Estado de São Paulo, a maioria na região da Baixada Santista e litorais sul e norte paulistas. "Eles estão divididos em artesanais (de canais) e os profissionais (de mar aberto). Mas a pesca também oferece possibilidade de ganho para guias de turismo, que levam pescadores amadores (que utilizam varas de pesca) e de costeira. Há ainda a subaquática (de mergulho). Ou seja, a dragagem constante prejudica uma cadeia muito grande", finaliza.

A conclusão do encontro resultou na criação de uma rede social com pescadores e técnicos para estudar a extensão dos impactos sobre as comunidades tradicionais de pescadores artesanais e possíveis linhas de ações para buscar a mitigação destes impactos ambientais e sociais.

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