Santos
Hipótese mais provável para o surgimento do item religioso data de 1904, mas mistérios acerca da sua criação e instalação perduram até os dias de hoje
A Santa Cruz do Marapé está localizada no final da Rua Joaquim Távora, no Marapé, em Santos / Reprodução/Google Maps
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Localizada no final da Rua Joaquim Távora, em Santos, a Santa Cruz do Marapé sempre foi rodeada de mistérios acerca da sua criação e instalação. Muitas histórias vêm sendo contadas até hoje, mas a verdade é que existem poucos registros oficiais acerca dela. Uma das versões parece ser a mais provável sobre o artefato religioso. Segundo consta, a cruz foi criada em 1904 e, portanto, pode-se dizer que ela "completou 120 anos" neste ano.
Uma reportagem do ano de 1980 relata que a cruz foi construída em 1904. Na época, foi encontrado até mesmo um homem envolvido na sua construção: o senhor Dionísio, um espanhol que tinha 80 anos. É dele a versão provável sobre o surgimento da cruz.
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Segundo Dionísio, naquela época, a Companhia Docas de Santos (CDS), proprietária daquela área que viria ser o bairro Marapé, queria interromper a queda de uma cachoeira que existia no local e servia para que as moradoras do povoado que se instalou ali lavassem suas roupas.
Sobre esta parte do relato, a historiadora Bruna Barbosa, do IHGS (Instituto Histórico e Geográfico de Santos), em entrevista ao Diário, explica que o que viria a ser um dos bairros mais tradicionais de Santos passou a receber trabalhadores locais, do interior e até de outros países, em razão da construção do cais do porto pela Companhia Docas de Santos. Este fato, reforça a informação dada por Dionísio de que havia um povoado ali.
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"O Marapé, como o próprio nome diz, 'Caminho para o mar', era um lugar de passagem e ação humana. Além disso, havia córregos de água dos morros, tornando o local propício para o assentamento humano. No final do século XIX e início do XX, a construção do cais trouxe um grande volume de mão de obra para a cidade. Na região do Outeirinhos foi construído o cais com armazéns que utilizaram tanto pedras dos outeirinhos como da pedreira do Jabaquara, muito próxima ao Marapé. Essa é uma atividade que pode indicar possíveis ocupações por ali".
Voltando à cruz, a história conta que houve então um protesto, e que a população local se reuniu com a CDS, solicitando que a queda d'água não fosse interrompida. O pedido foi atendido e, em razão disso, eles resolveram erguer uma cruz de pedra, em sinal de agradecimento.
Segundo contou na época, Dionísio foi um dos que construíram a cruz, ajudado por outros vizinhos. O senhor espanhol relatou que trabalhava em uma pedreira e de lá trouxe o material transportado em um carro de boi.
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A historiadora Bruna Barbosa afirma que, até aqui, a história contada por Dionísio confere.
"De fato existiu a pedreira, ela aparece em muitos mapas, principalmente aqueles que indicam obras da Companhia Docas de Santos. Há mapas que colocam a CDS bem próximo ao local onde hoje está a cruz", afirma.
Com a instalação da cruz no local, frequentemente velas passaram a ser colocadas ali e, durante o dia de Santa Cruz, em 3 de maio, festas, que hoje estão praticamente extintas, passaram a ser celebradas.
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"Há um registro em jornal, de 1914, que fala da Festa da Santa Cruz no Marapé, ainda indica a existência de uma capela, provavelmente construída por pessoas que frequentavam a área para ter um lugar para exercer sua fé", conta Bruna Barbosa.
Entretanto, sobre essa capela, sempre foi dito que a Santa Cruz do Marapé não possuía relação com ela. A historiadora, no entanto, contesta.
"Não tem como cravar que não há relação. Há uma história de que a capela foi construída pela família Peniche e ficava próxima à cruz, mas essa é uma pesquisa a ser desenvolvida. A gente tem que lembrar que antigamente a religião tinha um papel muito maior no cotidiano das pessoas e até na vida pública - registros de nascimento, morte, casamento, eram feitos pelas igrejas, que estavam imersas na vida das pessoas".
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Segundo a historiadora, a existência da cruz e esse indicativo de uma capela podem ser indícios do início da festa no Marapé.
"A festividade da Santa Cruz não é uma exclusividade de Santos, é uma festa católica que acontece em várias cidades. Acho possível sim que devotos tenham feito uma perto da outra intencionalmente, mas aí estou me utilizando do paradigma indiciário como uma forma de aproximar de uma verdade pouco palpável, como é a história real da cruz. Com tanto tempo transcorridos, sem testemunhas diretas e documentos, nos valemos dos indícios que sobreviveram para tentar construir a história sobre como essa cruz chegou lá", afirma.
É importante lembrar que a cruz não tem ligação com o cemitério vertical Memorial Necrópole Ecumênica, pois a cruz já existia ali bem antes da construção daquela edificação.
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