Polícia
Apesar do Primeiro Comando da Capital praticamente controlar o crime organizado no Estado de São Paulo, são as pequenas facções rivais que impõem a ditadura do terror nos assassinatos dentro de presídios
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“Por incrível que pareça os presídios que mais tiveram mortes no ano passado e nos anteriores foram as unidades prisionais que têm elementos de oposição ao Primeiro Comando da Capital (PCC)”. A revelação é do presidente do Sindicato dos Agentes de Segurança Penitenciária do Estado de São Paulo (Sindasp), Daniel Grandolfo, que detalhou a situação com exclusividade ao Diário do Litoral. Dados da Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) apontam que 23 presos foram mortos nos presídios paulistas em 2013. Na maioria dos casos, a motivação foram desavenças pessoais.
Conforme apurou o DL, as facções rivais ao PCC no Estado são o Comando Revolucionário Brasileiro do Crime (CRBC), Seita Satânica, Terceiro Comando da Capital (TCC) e Comando Democrático da Liberdade (CDL). No meio do ano passado, uma nova organização, denominada “Cerol Fino”, com dissidentes do PCC, começou a se formar nos presídios paulistas. O grupo ficou marcado pela forma cruel como elimina seus rivais: decapitações.
“Chamamos de oposição (outras facções) porque 99% das cadeias Rivais do PCC são os que mais matam em presídios são dominadas pelo PCC. A oposição mata muito mais que o PCC, que não mata muito dentro da unidade prisional. Pode não parecer verdade. Isso porque os presos de outras facções não ousam entrar em presídios dominados pelo PCC”, explica Grandolfo.
De acordo com o presidente do Sindasp, quando o preso adversário do PCC chega em um presídio dominado pela facção, ele pede transferência para outra unidade prisional. “Eles informam aos agentes que são de outras facções e não podem ficar ali, onde correm risco de vida”. Em algumas situações, esses presos são deslocados para celas conhecidas como “seguro”, destinadas aos presos jurados de morte. Nestes casos, os agentes penitenciários identificam os presos rivais e os mantêm afastados uns dos outros.
Ainda segundo o presidente do Sindasp, as mortes em presídios dominados por facções rivais ao PCC ocorrem na “trairagem”. “O PCC avisa antes que vai matar, nunca ataca pelas costas. Fala o bicho vai ficar ruim para você, se não vazar. Ai o cara vai embora, pede transferência para o presídio dominado por sua facção”. Grandolfo afirma que algumas facções costumam atacar seus rivais pelas costas. “Já nas outras cadeias, o preso (das outras facções) avisa que está tudo bem, que não vai acontecer nada e ataca o rival”.
Para a doutora em sociologia Camila Nunes Dias, uma das maiores estudiosas do assunto no Brasil, o domínio do PCC reduziu o número de mortes nos presídios paulistas. “A facção domina 90% dos presídios paulistas e por isso essas mortes deixaram de ocorrer. Nas cadeias controladas pelo PCC quase não há assassinatos”.
Camila ainda afirma que uma série de fatores contribui para a criação de facções criminosas nos presídios. “O Estado se preocupa em prender, mas não garante a condição mínima de vida do presidiário nas cadeias, abrindo mão do controle e abrindo caminho para a formação de facções criminosas”.
A população prisional de São Paulo é de 210.677 mil, correspondendo a aproximadamente 40% da população carcerária do Brasil, tendo 155 presídios para abrigar estes detentos, de acordo com a SAP. Ainda segundo o órgão estadual, 87% das cadeias paulistas sofrem com problemas de superlotação. Nos últimos três anos, houve o aumento de 39.848 presos na população carcerária paulista.
Secretaria nega que facções reduziram mortes na cadeia
A Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) rebateu, em nota, que as facções criminosas que dominam os presídios paulistas foram as responsáveis pelos controles nos assassinatos nos últimos anos nas cadeias.
“A SAP possui um corpo funcional altamente qualificado para manter a ordem e a disciplina nos presídios. É graças à ação desses abnegados funcionários, aliada ao serviço integrado de inteligência da SAP e das Polícias Civil e Militar também da tecnologia disponível – como detectores de metais, máquinas de Raio-X, etc – que hoje todas as unidades prisionais da SAP funcionam dentro dos padrões de segurança e disciplina”, afirma o órgão.
Ainda segundo a SAP, os presos suspeitos de envolvimento em assassinatos são transferidos para cela disciplinar, visando uma melhor apuração dos fatos. “É comunicado o juiz de Direito da Vara de Execuções Criminais responsável e a autoridade policial para elaboração do boletim de ocorrência e instauração do devido inquérito policial e medidas cabíveis”.
De acordo com a SAP, um procedimento disciplinar apuratório em desfavor dos envolvidos ainda é instaurado com procedimento preliminar, para a devida elucidação sobre falta funcional. “Quando a culpabilidade é evidente a SAP solicita, ao Juiz de Direito das Execuções Criminais, a internação dos presos no regime disciplinar diferenciado, com proposta de permanência por um período de 360 dias”.
Facções rivais ao PCC
CRCB
Criado em 1999, o Comando Revolucionário Brasileiro do Crime é a principal organização que comanda o presídio de Guarulhos, sendo o principal rival do PCC. A organização não promove rebeliões, mas é responsável por assaltos, sequestros e ataques a alvos públicos. Um trecho do estatuto do CRBC indica a ira dos membros com o PCC.
TCC
O Terceiro Comando da Capital (TCC) foi criado por César Augusto Roris da Silva, o Cesinha, ex-líder do PCC, morto em 2006 após mandar matar a esposa de Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, outro líder do PCC. Após a morte de Cesinha, a organização perdeu força nos presídios.
Seita Satânica
Criada fora dos presídios é uma das mais recentes cédulas criminosas fundadas no Estado. Seus integrantes são obrigados a cortar a falange do dedo mínimo.
CDL
O Comando Democrático da Liberdade nasceu em 1996, na Penitenciária de Avaré. Detém o controle de alguns presídios paulistas, tendo participado de algumas rebeliões. Age com crimes discretos nas cidades.
Facção criminosa corta cabeça de rivais
As cenas de decapitações de presos no Complexo de Pedrinhas, no Maranhão, que aterrorizaram e assombraram o País e o Mundo, não são uma realidade apenas do sistema carcerária daquele estado.
Em meados do ano passado, o grupo chamado “Cerol Fino” começou a fazer decapitações nos presídios paulistas. O nome é uma alusão às linhas de pipa que são feitas com cola de madeira e caco de vidro moído, que cortam como navalha.
Um dos presos eliminados pelo grupo no Estado de São Paulo teve a cabeça decapitada, o coração arrancado, a barriga cortada e a cabeça colocada dentro dela.
Ao menos 50 presos pertencem ao “Cerol Fino”. Outros seis assassinatos dentro de presídios paulistas em 2013, com o mesmo modo de execução brutal, são atribuídos ao grupo.
Trecho de número 7 do estatuto do CRBC
“Onde quer que o CRBC estiver NÃO PODERÃO EXISTIR INTEGRANTES DO PCC, pois os mesmos, através da ganância, extorsão, covardia, despreparo, incapacidade mental, desrespeito aos visitantes, estupros de visitantes, guerra dentro de seus próprios domínios, vêm colaborando para a vergonhosa caotização do aparato Penal do Estado de São Paulo. Portanto, não podemos conviver com esses “lixos”, escórias, animais sem o menor senso de racionalidade. Estes, definitivamente, não podem e não devem conviver com aqueles que têm suas famílias sacrificadas e igualmente condenadas, que lutam contra as dificuldades de nosso País, por nossas liberdades”.
Governo anuncia construção de novos presídios
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), prometeu, na última quinta-feira, entregar até o fim de 2014, 11 unidades prisionais no Estado. As novas unidades abrirão 8.728 vagas – serão três novos presídios em março.
Entre as unidades a serem inauguradas estão as Penitenciárias de Bernardino de Lima, o Centro de Progressão Penitenciária de Porto Feliz, a Penitenciária Masculina de Piracicaba e Feminina de Votorantim.
Segundo Alckmin, o objetivo é retirar os presos das cadeias públicas anexas a distritos policiais, meta de governo desde 2005. “Queremos zerar (o número de presos em cadeias). Espero, em seis meses, não ter nenhuma mulher em cadeia. Depois, zerar a população masculina. São Paulo será o primeiro Estado no Brasil a não ter preso em cadeia”.
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