Polícia
Investigação realizada aponta que o empresário Carlinhos Virtuoso detém 217 pontos de jogo do bicho em Santos, São Vicente e Praia Grande
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“Sou o dono da banca do bicho". O autor da frase sabia muito bem o peso de cada palavra ao prestar depoimento no Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco). Em depoimento ao promotor Rodrigo Dacal, ele confessou ser proprietário de mais de 200 pontos de jogo do bicho em Santos, São Vicente e Praia Grande.
A confissão foi feita pelo empresário Carlos Eduardo Virtuoso, o Carlinhos Virtuoso, de 50 anos. Ele é apontado pelo Gaeco – órgão ligado ao Ministério Público – como responsável pela ‘Banca do Damasco’. Carlinhos herdou o comando da banca de seu pai, Damasco Virtuoso, que faleceu em dezembro de 2007.
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De acordo com dados obtidos no computador de Carlinhos Virtuoso, a ‘Banca da Damasco’ arrecadou num intervalo de 1 ano e oito meses a quantia de R$ 81.740.164,07. Desse montante, R$16.680.763,62 foram destinados ao empresário.
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Em maio passado, um mês antes de o MP realizar a operação, a ‘Banca da Damasco’ obteve lucro de R$ 4.100.000,00. O valor mensal arrecadado era de aproximadamente R$ 1 milhão de reais, sendo R$ 700 mil reais destinados diretamente para Carlinhos Virtuoso.
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O empresário foi denunciado pelos promotores do Gaeco pelos crimes de corrupção ativa, formação de quadrilha armada, contravenção e lavagem de dinheiro. Se condenado, a pena mínima para o bicheiro é de 10 anos de reclusão em regime fechado.
Organização
Segundo o Gaeco, a organização do bicheiro contava com 36 funcionários, entre eles cinco investigadores-chefes lotados no Departamento de Polícia Judiciária do Interior (Deinter-6), três policiais militares aposentados e outro dois ex-PMs. Todos os integrantes da ‘Banca do Damasco’ foram denunciados pelo MP.
As investigações apontam que os pontos de jogos de responsabilidade de Carlinhos Virtuoso estão instalados em padarias, bares, mercados, bancas de jornal e outros estabelecimentos comerciais. Em São Vicente, o bicheiro detinha 148 pontos, outros 46 em Santos, e 23 em Praia Grande. Cerca de 200 cambistas trabalhavam nestes locais.
“A organização criminosa se estruturou de forma permanente com vistas ao alcance de seus objetivos de lucro, mediante a exploração do jogo do bicho em inúmeros pontos situados nas cidades de Santos, São Vicente e Praia Grande, com divisão de tarefas entre seus integrantes e com a participação de agentes públicos (policias), mediante o pagamento de propina, e testas-de-ferro, inclusive para lavagem dos valores ilícitos obtidos”, assinalam os promotores do Gaeco em denúncia oferecida à Justiça de Santos.
Para manter próximo dos padrões da legalidade, de acordo com a investigação do Gaeco, o empresário montou uma organização sediada em um prédio, localizado na Rua Batista Pereira, no Macuco, em Santos, que contava com cinco núcleos. O prédio é apontado como a ‘fortaleza do jogo do bicho’.
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Os grupos eram divididos por setores: operacional, de segurança, policial, gerencial e o de lavagem de dinheiro. A operação para desmantelar a ‘Banca da Damasco’ ocorreu no dia 6 de junho. No início do ano, promotores do Gaeco deram início às investigações que culminariam na ação do MP. Nesse período, os promotores flagraram policiais civis se encontrando com um dos gerentes da ‘Banca da Damasco’ , A.V., que seria, segundo a investigação, o responsável pelo pagamento de propina aos policiais. Além dele, outro envolvido, A.B.D.S. também tinha como função a gerência da banca.
Com outra geração
O gerente A.V. já trabalhava na ‘Banca da Damasco’ com o pai de Carlinhos Virtuoso. Os gerentes eram homens de confiança do bicheiro, já que eram responsáveis pelas ações mais importantes realizadas na exploração do jogo do bicho. O bicheiro também contava com duas mulheres de confiança. Elas eram responsáveis por receberem o dinheiro proveniente do jogo do bicho e lavar todo o dinheiro obtido pelo bicheiro na exploração da atividade ilícita.
Além de flagrar o pagamento de propinas, o MP acompanhou toda movimentação que ocorria na sede do jogo do bicho. A saída e entrada de funcionários, a forma de atuação dos seguranças, dos motoboys responsáveis por recolherem as apostas e os valores pagos pelos apostadores.
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Um grupo formado por policias militares aposentados e ex-policiais militares realizavam a segurança da sede do jogo do bicho. Eles eram comandados por dois irmãos – PMs reformados. Havia uma escala de trabalho previamente definida. Os seguranças eram encarregados de assegurar proteção contra possíveis assaltos e ações contra o prédio de Carlinhos Virtuoso e acompanhavam a recolha de dinheiro nos pontos de jogos. Eles recebiam inclusive o 13º salário, tal como qualquer empresa legalizada, aponta a denúncia do Gaeco.
Pedido de prisão preventiva
Após concluir o depoimento dos denunciados, o MP apresentou a denúncia à Justiça. Promotores do Gaeco solicitaram a prisão preventiva de Carlinhos Virtuoso, dos dois gerentes, e dos cinco investigadores-chefes envolvidos na ‘Banca do Damasco’.
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Os policiais civis envolvidos na organização de Carlinhos Virtuoso foram denunciados pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha armada. Assim como os gerentes da ‘Banca do Damasco’.
O juiz da 5ª Vara Criminal de Santos, Walter Luiz Esteves de Azevedo, indeferiu o pedido dos representantes do MP. “Não existe risco aparente à instrução criminal, nem à aplicação da lei penal. Também não está indicado que os denunciados tenham mantido a atividade ilícita”, assinalou Azevedo em sua decisão.
Segundo o promotor do Gaeco Rodrigo Dacal, o MP já entrou com recurso perante a decisão. “A banca continua funcionando normalmente. Inclusive flagramos um motoboy durante as investigações e ele continua apanhando os valores e recebendo as apostas. Uma amostra clara de continuidade da atividade ilícita”.
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Em relação aos policiais militares que realizavam a segurança da ‘Banca do Damasco’, o Gaeco solicitou que o 6º Batalhão de Polícia Militar do Interior (BPM/I) tome medidas administrativas, já que os envolvidos não estão mais na atividade de suas funções.
Como agia
As investigações conduzidas pelos promotores do Gaeco apontam que Carlinhos Virtuoso lavava o dinheiro de duas maneiras. A primeira era por intermédio da movimentação de valores em dinheiro, obtidos pela organização criminosa, que não constavam nas informações e declarações fiscais, com aquisição de bens, em sua grande maioria carros, colocados em nome dos funcionários da banca.
“Carlos Eduardo Virtuoso adquiriu veículos em nome de seus funcionários, como forma de dissimular e ocultar a origem dos recursos, sua disposição e movimentação”, aponta a denúncia do Gaeco.
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O bicheiro teria adquirido 30 veículos, entre carros e motocicletas, efetuando o pagamento em dinheiro e colocando em nome de seus funcionários. “Após adquirir os veículos, o bicheiro colocava os veículos em nome dos funcionários. Depois, os funcionários faziam uma procuração para colocar os veículos no nome de um dos gerentes e este depois repassava a documentação para Carlinhos Virtuoso”, explica Dacal.
Em depoimento ao Gaeco, todos os funcionários da ‘Banca do Damasco’ confirmaram a participação na organização criminosa, afirmaram que os veículos em seus nomes eram utilizados pela banca e que não eram os verdadeiros donos dos automóveis.
Método ‘mescla’ utilizado pelo bicheiro
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Ainda segundo a denúncia, Carlinhos Virtuoso montou a empresa ME2 Entretenimento Ltda., em 2009, e o Restaurante Lion, no Gonzaga, em 2011, para a lavagem de dinheiro. Dacal afirma que o bicheiro utilizou o método conhecido como ‘mescla’, quando misturam-se recursos ilícitos com os lícitos de uma empresa.
Ou seja, o bicheiro recebia dinheiro proveniente do jogo do bicho e injetava nas duas empresas, pagando seus impostos, suas despesas e outros gastos gerados pelo comércio.
“Vale dizer, valia-se de empresas regularmente constituídas, sob o aspecto formal, e com objeto social declarado aparentemente lícito (realização de eventos e restaurante), para lavar o capital ilícito, dando a aparência de licitude ao negócio e aos recursos decorrentes, como se tudo fosse resultado da exploração de atividades lícitas por ele e suas empresas”, assinalam os promotores do Gaeco na denúncia.
Carlinhos Virtuoso tem bens sequestrados
Para o Gaeco, com o dinheiro recebido da exploração do jogo do bicho, Carlinhos Virtuoso adquiriu em nome da ME2 Entretenimento Ltda., em julho de 2011, quatro conjuntos comerciais no edifício comercial Tribuna Square, que está em construção, na Rua João Pessoa. O bicheiro teria desembolsado a quantia de R$ 2.976.800,00.
Ainda segundo as investigações, em novembro de 2010, o bicheiro já havia comprado, em nome da ME2 Entretenimento Ltda., um imóvel em um prédio no bairro Moema, em São Paulo, no valor de R$ 1.177.808,64.
O empresário ainda adquiriu em nome da empresa duas embarcações, uma no valor de R$ 140.000,00 e outra no valor de R$ 2.900.000,00.
De acordo com Dacal, o Gaeco sequestrou esses imóveis, embarcações, além de veículos em nome de Carlinhos Virtuoso e a quantia de R$ 1,5 milhão. Ainda foi solicitado o sequestro dos R$ 81. 740. 164,07 obtidos pela ‘Banca do Damasco’ em um período de um ano e oito meses. Os promotores aguardam decisão da Justiça de Santos.
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