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O ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso disse ontem (23) que o contingenciamento de R$ 69,9 bilhões do Orçamento Geral da União deste ano é uma consequência dos erros do governo atual, que agora "está pagando seus pecados" com as medidas de contenção que está adotando.
"O Brasil foi tão mal governado nos últimos anos que o corte é consequência disso. A situação é muito grave no Brasil. O problema é que a responsabilidade é dos governos. Não era necessário que tivesse sido feito tanto erro como foi feito, tanto gasto. O Brasil começou a gastar como se os gastos fossem ilimitados. Agora estão pagando a conta, e, como foi esse mesmo governo que mais errou, é bom que seja ele também que tenha que tomar as medidas mais duras", disse o ex-presidente, em entrevista a jornalistas no início da tarde.
Após proferir palestra sobre o futuro do Brasil em uma universidade de Brasília, Fernando Henrique Cardoso criticou a forma como as medidas estão sendo tomadas pelo governo. "É uma espécie de operação sem anestesia. Quando você faz uma contenção fiscal, você tem que explicar ao país o que vem depois, para que você faz, qual é a esperança, o horizonte. E até agora nós só estamos vendo nuvem negra. Aí as pessoas ficam irritadas e não aceitam."
Para o ex-presidente, o país vive um momento de "dúvida híbrida" sobre o sistema político – se é presidencialista ou parlamentarista. "Nosso sistema é presidencialista, pressupõe a ação forte do presidente. Quando o Congresso percebe que o presidente, por razões várias, não está exercendo esse poder, ele tenta ocupar o espaço. E, como ele não está organizado como no [sistema] parlamentarista, pela maioria de partidos, é fragmentário. Então fica essa sensação de uma certa confusão, que é o que está acontecendo hoje", afirmou.
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Fernando Henrique Cardos disse que "falta o comando" no país e quem vai exercê-lo não tem as condições adequadas para isso, uma vez que os partidos não estão organizados para constituir maioria estável no Congresso. "A presidente delegou a negociação política ao vice [Michel Temer], que é do PMDB, e a negociação econômica ao [ministro da Fazenda, Joaquim] Levy, que é do mercado. É difícil saber como você vai compor esse quadro todo mais tarde", disse.
Em referência à representação que será feita nesta semana pela oposição à Procuradoria-Geral da República (PGR) para que a presidenta Dilma Rousseff seja investigada por crime comum – em função de supostas irregularidades no repasse de recursos do Tesouro a banco públicos – o ex-presidente disse que o impeachment não pode ser uma bandeira de luta.
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"Se houver provas contundentes de que a presidente é responsável por alguma coisa que é cabível na Lei do Impeachment, cabe o impeachment. Mas tem que haver [provas]. Isso não pode ser uma bandeira de luta, é um objetivo errado. O objetivo é apurar tudo, esse é o objetivo da democracia. Se houver [provas], cai, se não, não [cai]. Mas você não pode, como ponto de partida, [dizer] quero derrubar o presidente. Isso não é democrático. Para derrubar, você tem que seguir as regras da democracia", defendeu.
Durante a palestra Brasil, Qual Será o Seu Futuro?, o ex-presidente afirmou não ser pessimista em relação ao país. Segundo ele, o Brasil tem um "potencial enorme" e precisa focar alianças tendo em vista o polo do crescimento. "Não sou contra o Brasil ter relações com Ásia, África e com a China. Mas você não pode ter [relações] por razões ideológicas. Ou seja, porque eu sou Sul, aquele é Norte. Onde está o retorno de crescimento? O que aponta para o futuro? Para garantirmos o Brasil do futuro, vai depender de decisões estratégicas. Um erro estratégico custa anos. Não só o Brasil corre esse risco."
Para o ex-presidente, o Brasil tem que pensar em decisões estratégicas sobre como refazer a base energética, educacional e política. Ele acredita que, com o aumento da capacidade de expressão dos cidadãos e os movimentos de rua e na internet, vão surgir no país lideranças fora do circuito tradicional.
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Procurado pela Agência Brasil para comentar as declarações de Fernando Henrique Cardoso, o Palácio do Planalto declarou que não se manifestará. Nessa sexta-feira (22), quando explicou os cortes no Orçamento, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, disse que todos os projetos do governo vão continuar em execução e que o ritmo das ações será adequado ao novo limite financeiro. Barbosa afirmou ainda que "o investimento está sendo priorizado no que é possível".