Brasil
Cerca de um quarto de toda a poluição plástica está em áreas em alto-mar, o local preferencial de busca de alimentação dessas aves
De acordo com os pesquisadores, a anatomia dos animais e o fato de serem aves migratórias de longas distâncias os coloca em maior risco para a ingestão de plástico encontrado nos oceanos, mesmo em lugares remotos, como as ilhas do noroeste do Pacífico. / Foto - Nair Bueno/DL
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Cerca de 1 em cada 4 das espécies de aves marinhas sob risco de extinção sofre com acúmulo elevado de plástico nos oceanos nas regiões em que habitam. Nessas áreas, o risco de exposição ao plástico pode afetar até metade dos animais observados, incluindo espécies criticamente ameaçadas.
Cerca de um quarto de toda a poluição plástica está em áreas em alto-mar, o local preferencial de busca de alimentação dessas aves.
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Muitas delas são migratórias e percorrem longas distâncias nos períodos de reprodução para achar um lugar adequado para nidificar. No percurso, podem ter contato com esse acúmulo elevado de lixo plástico nos oceanos.
Essas conclusões estão em estudo conduzido por 200 cientistas em 27 países, publicado na última terça (4), na revista especializada Nature Communications. A pesquisa contou com instituições de Reino Unido, Itália, França, Austrália, Nova Zelândia e Brasil, entre outros países, e da BirdLife International, maior organização para apoio à conservação de aves.
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O estudo monitorou 7.137 indivíduos adultos de 77 espécies de petréis, um grupo de aves marinhas que compreende atualmente 123 espécies com distribuição global em todos os oceanos. Aproximadamente metade (64) das espécies do grupo são classificadas como vulneráveis ou quase vulneráveis, 16 são ameaçadas e outras 12 são criticamente ameaçadas, segundo a IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza).
De acordo com os pesquisadores, a anatomia dos animais e o fato de serem aves migratórias de longas distâncias os coloca em maior risco para a ingestão de plástico encontrado nos oceanos, mesmo em lugares remotos, como as ilhas do noroeste do Pacífico.
Para analisar o risco de exposição ao plástico, os cientistas estimaram as áreas com maior densidade desse tipo de lixo no mar de 1995 a 2020. Em seguida, cruzaram as estimativas de densidade plástica com os dados de locomoção das aves, obtendo assim um nível de risco de exposição.
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Do total de espécies estudadas, pelo menos 19 (24,6%) são consideradas de muito alto risco à exposição plástica, incluindo as espécies criticamente ameaçadas pardela-do-Mediterrâneo (Puffinus mauretanicus), pardela de Newell (Puffinus newelli) e petrel-do-Havaí (Pterodroma sandwichensis), além de ameaçadas como pardela de Yelkouan (Puffinus yelkouan), petrel de Cook (Pterodroma cookii) e petrel-de-óculos (Procellaria conspicillata).
Os lugares de mais alto risco à exposição plástica incluem o mar Mediterrâneo e mar Negro, o noroeste do Pacífico, o nordeste do Pacífico, o Atlântico Sul e o sudoeste do Índico. Os três últimos fazem parte dos chamados giros oceânicos, que são regiões de alta concentração de lixo plástico no mar.
Por fim, como as aves são migratórias e visitam locais distintos durante as estações de reprodução, os pesquisadores calcularam se os riscos à exposição plástica seriam os mesmos. O que eles observaram é que algumas das espécies com um risco baixo de exposição ao conteúdo plástico durante a fase migratória tinham um risco elevado nos locais de reprodução.
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É o caso do bobo-grande (Calonectris diomedea), uma espécie de petrel que migra durante o inverno para o leste do Atlântico, onde há baixa exposição ao lixo plástico, mas se reproduz em Malta, no meio do Mediterrâneo, região com alta concentração de poluição.
Para Bethany Clark, pesquisadora do BirdLife International e primeira autora do estudo, o pouco conhecimento que se tem sobre algumas das espécies que habitam ilhas remotas do Pacífico limita o trabalho, que deve agora investigar a associação entre exposição, ingestão e impacto.
"É importante que estudos de ingestão e rastreamento de plástico em áreas com poucos dados, como o sudeste da Ásia e partes do Pacífico, sejam também encorajados no futuro, incluindo locais onde é difícil estudar essas aves, mas elas ainda assim são afetadas pela atividade humana", disse.
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Os autores do artigo ressaltam, porém, que o risco elevado de exposição ao plástico não indica necessariamente a ingestão do material. Na realidade, estudos que monitoram o comportamento alimentar e a ingestão de lixo plástico e substâncias tóxicas por aves são complexos e há poucos dados globais, o que torna a padronização deste tipo de informação mais difícil.
Como a maioria das aves têm como comportamento alimentar regurgitar o conteúdo diretamente na boca dos filhotes, a exposição de plástico destes depende do tipo de exposição dos pais durante o período reprodutivo, explica Clark.
"É difícil calcular com precisão o risco ao longo da vida, mas estudos de longo prazo podem ser muito valiosos nesse sentido", afirma.
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Ana Carneiro, brasileira que é pesquisadora do BirdLife International e também participou do estudo, ressalta que o estudo é único em identificar os chamados "hotspots" (regiões de alta concentração plástica) que podem determinar políticas públicas de conservação.
"Detectar as áreas de maior risco só foi possível com o compartilhamento de informações e a colaboração de mais de 200 cientistas em conjunto com o Seabird Tracking Database [coleção internacional de dados]", explica.
Quanto ao Brasil, segundo Clark, apesar de o país ter um risco relativamente mais baixo, algumas regiões costeiras apresentam alto risco de exposição plástica, especialmente em direção ao sul, incluindo locais que são importantes para aves marinhas ameaçadas, como o petrel-de-óculos, o petrel-do-Atlântico (criticamente ameaçado) e o petrel-de-Trindade (ameaçado).
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"Mais pesquisas sobre soluções para reduzir o plástico nos mares seriam valiosas, incluindo a redução de uso de descartáveis, melhorar a reciclagem e o gerenciamento de resíduos e a criação de legislações específicas que proíbam o descarte de plástico das embarcações", afirmou.
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