Brasil

Relembre histórias da boate Love Story, a 'casa de todas as casas'

Uma das lendas mais contestadas pelos frequentadores é que o lugar era um "puteiro"

Do Uol/Universa/Folhapress

Publicado em 15/11/2022 às 15:11

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Reprodução/Redes Sociais/Oba Oba

O Love Story não existe mais, mas os devaneios em torno da boate mais famosa de São Paulo na década de 1990 e 2000 ainda rondam as lembranças de quem vivenciou todas as fases da casa, e principalmente de quem "só ouviu falar". Uma das lendas mais contestadas pelos frequentadores é que o lugar era um "puteiro" e que as mulheres eram desvalorizadas lá. A empresária, DJ e produtora de festas, Lily Scott, uma das sócias do novo Love Story (Love Cabaret previsto para inaugurar em janeiro de 2023) afirmou em recente entrevista ao UOL: ".Também foi a casa que por muito tempo objetificou o corpo feminino.".

Não é o que contam quatro mulheres das mais diferentes realidades e que por muitos anos frequentaram o lugar. Aos 47, Janaína Rueda, chef do restaurante "Dona Onça", tem uma relação familiar com "a casa de todas as casas". Sua mãe era amiga do ex-proprietário, seu João, e desde a adolescência ela esticou as noites de diversão no Love: "É o contrário do que as pessoas falam sobre ser um puteiro. Na verdade, era um encontro até o sol raiar", diz.

A empresária Cristiane Fernandes, de 49 anos, frequentou o Love nos anos 1990 e relata que ao entrar na balada você 'estava no jogo': "O melhor do Love era a diversidade, juntava todo tipo de gente, era muito legal. Eu me sentia livre". Quem tem a mesma versão é Camila Pereira Manoel, a Kakau, 33, que saía três vezes por semana de Guaianases, extremo da zona leste paulistana, para ir à danceteria nos anos 2000. "Eu batia cartão e nunca sofri assédio. Os homens perguntavam se a gente estava trabalhando, mas era só responder e eles saiam. Quem encostasse em mulher à força era expulso. A única casa onde o cliente não tinha razão. As putas, sim", diz Kakau, que atualmente é influenciadora digital.

Quem também desfrutou dos últimos anos do Love Story foi a atriz pornô Rebecca Santos, 25. "Ganhei muito dinheiro trabalhando lá, não posso reclamar. Quando passo na frente penso "PQP, que saudades", diz a ex-garota de programa, que ressalta: "Era cada um no seu quadrado." 

De Luana Piovani a Mike Tyson

Ponto de encontro pós-balada, o lugar reunia o público mais diversificado que a a noite paulistana já presenciou: celebridades, como Sabrina Sato, Luana Piovani, Erick Jacquin, Fafá de Belém, David Gueta e Caio Castro, e nomes estrangeiros como Mike Tyson, playboys e patricinhas, empresários e funcionários, garotas de programas, casais heterossexuais, LGBTQIA+. Foi ali que essas quatro mulheres aprenderam a respeitar as diferenças e viveram momentos marcantes, que as tornaram figurinhas carimbadas do local. Para Cristiane, a recordação de não ter que mentir em casa por estar na balada ainda é presente."Não era um problema dizer para meus pais eu estava no Love, eles sabiam que eu estava com os meus amigos", afirma.

Já Rebecca, Janaína e Kakau tornaram-se promoters da casa. Rebecca é de Santa Catarina e aos 18 anos mudou-se para o centro de São Paulo. Pouco tempo depois, estava vivendo as experiências inusitadas que só a boate proporcionava: "Uma vez me levaram para conhecer um rapaz cego que sempre ficava no camarote. A gente se tocou, conversou e logo saiu de lá. Foi um momento muito legal, trocamos telefone e nos encontramos mais algumas vezes", relembra a jovem, que com a "fama" conquistada no lugar tornou-se atriz da produtora de filmes pornô As Brasileirinhas. "Organizei o último Carnaval Brasileirinhas do Love antes da pandemia. Os homens pagavam R$ 400 a entrada e ficavam de máscara. Foi top, coloquei mais de 100 mulheres lá", conta. "Organizei o último Carnaval Brasileirinhas do Love antes da pandemia. Os homens pagavam R$ 400 a entrada e ficavam de máscara. Foi top, coloquei mais de 100 mulheres lá", conta.

Janaína também tem boas recordações dos eventos no Love. "Não esqueço quando criamos o 'Porco Love Japan' para celebrar o aniversário de São Paulo e levamos boa parte da colônia japonesa da cidade para a festa no Love", recorda a chef.

O que não falta para a moradora da zona leste é história sobre a Love Story. Foi lá que conheceu várias celebridades, entre elas, a atriz Luana Piovani, com quem teve uma conversa que não combinou com o pensamento de quem sempre estava lá: "No dia em que fomos apresentadas pelo pessoal da casa, falamos sobre tudo e foi muito bom, mas em determinado momento ela falou para eu não ficar triste, mas aquele não era um bom lugar para criar vínculos e que eu devia parar de frequentar", não concordei por tudo o que já tinha vivido ali", relata.

A dica não funcionou. Kakau é criadora do grupo "Baladeiros Love Story", que até hoje mantém contato, e ainda levou parentes e amigos da periferia para se divertirem no centro. "Era julgada por levar o povo do meu bairro para a balada eletrônica, mas defendia o lugar com unhas e dentes", conta. Ela ainda relembra a sensação de entrar pela primeira vez na Love: "Era uma adolescente da Zona Leste que só frequentava o Nação Tan Tan, em Itaquera, e quando entrei lá fiquei abismada e encantada com o som, as luzes, gente bonita, mulheres bem vestidas, salto, perfume, homens mais velhos, engravatados, bom whisky. Foi ali que venci na vida", diz a empresária, que vai além sobre a importância do espaço na sua vida: "No Love comecei a desconstruir essa ideia de gênero, classe social, xenofobia, misoginia e que me entendi como mulher.".

O fim e o recomeço 

O Love Story começou a perder o encanto com a mudança para a República, em frente ao Edifício Copan, em 2000. Depois dos problemas financeiros, somado com a falta de segurança no centro da cidade e a pandemia, veio o pedido de falência e o fechamento das portas em 2021. Rebecca, por exemplo, viu seu faturamento cair por causa da fuga dos homens que pararam de frequentar o Love com medo dos assaltos. "Dependia daquele lugar para ganhar dinheiro e isso foi muito chato. Tinha muito assalto na porta, clonagem de cartão e insegurança", diz.

Para quem frequentou e experimentou o Love "raiz" é difícil imaginar como será essa nova versão da casa. A expectativa de Kakau é alta, mas ela duvida que terá a mesma energia: "Eu conheço as casas do Facundo [Guerra], mas nesse caso acho que não terá mais o senso de coletividade. Será um Love Story gourmetizado, com outra pegada", acredita.

Uma das paulistanas mais representativas, Janaína Rueda também não tem certeza se vai conhecer a boate: "Pode ser que eu vá conhecer, mas depende da proposta. O que me interessa na noite é a música, a troca de energia aérea, cantante, a dança", finaliza.

O Love Cabaret não tem a pretensão de ser o Love Story. A nova administração, que além de Lilly Scott tem os empresários Facundo Guerra e Cairê Aoas como sócios, será um espaço com curadoria artística, tudo programado. Aquele clima de espontaneidade, tudo pode, entra quem quer e faz o que quer, vai ter que encontrar um outro endereço.

Por Fernanda Grilo/Universa/Uol

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