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Número de queimadas na caatinga em 2023 foi o mais alto desde 2010

Número representa um aumento de 39% em relação ao ano anterior

JÉSSICA MAES - FOlhapress

Publicado em 03/01/2024 às 10:40

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Número representa um aumento de 39% em relação ao ano anterior / Joédson Alves/Agência Brasil

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O ano de 2023, que acumulou desastres climáticos e temperaturas extremas, foi também o recordista em mais de uma década quanto às queimadas na caatinga.

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Segundo dados do sistema BDQueimadas, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), foram registrados mais de 21,5 mil focos de calor no bioma, o índice mais alto desde 2010, quando o bioma teve 21,8 mil focos. O sistema usa imagens de satélite para detectar ocorrências de fogo com mais de 30 m².

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O número representa um aumento de 39% em relação ao ano anterior e é mais um dos fatores impactados pela ocorrência do El Niño, que trouxe mais calor e menos chuva para a região.

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O fenômeno é caracterizado pelo aquecimento das águas do Pacífico na região equatorial -o que, no Brasil, se traduz em mais seca nas regiões Norte e Nordeste e excesso de precipitação no Sul e Sudeste.

A caatinga é o único bioma totalmente brasileiro, ocupando uma área equivalente a cerca de 10% do território nacional e englobando os estados de Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Piauí, Sergipe e o norte de Minas Gerais.

Segundo o coordenador da equipe caatinga da plataforma Mapbiomas, Washington Rocha, professor da Universidade Estadual de Feira de Santana, o fogo nunca ou muito raramente acontece de forma natural no bioma.
"Pode-se dizer que as causas predominantes dos incêndios nessa região se devem a ações antrópicas, sobretudo por uso de queimadas para limpeza de áreas a serem preparadas para cultivo e que, devido ao manejo inadequado, torna-se incêndios", explica.

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Esse tipo de uso do fogo se torna mais perigoso quando as condições climáticas estão propícias para o espalhamento das chamas, como tempo seco, vento forte e temperaturas elevadas.

"Mas há também relatos dos incêndios criminosos, aqueles que são deliberadamente provocados como forma de fomentar o desmatamento, para viabilizar novas áreas para agricultura ou pastagem", acrescenta o pesquisador.

Ele afirma que as áreas com maior atividade de desmatamento estão nas vizinhanças das fronteiras agrícolas e pecuárias, próximas a infraestruturas de geração de energias renováveis e também perto dos canais de transposição do rio São Francisco.
Com uma biodiversidade adaptada às altas temperaturas, a região é rica em endemismo. Um artigo recente estima que há ao menos 3.347 espécies de plantas no bioma, sendo que 15% delas só existem ali.
Segundo o Mapbiomas, a perda líquida de vegetação (balanço entre desmatamento e regeneração) na caatinga entre 1985 e 2022 foi de 10,8%, enquanto a área dedicada à agropecuária no bioma cresceu 21,8%. No mesmo período, quase 105 mil km² de vegetação foram atingidos pelo fogo no bioma.
Grande parte dos focos de calor na caatinga em 2023 se concentrou no Piauí (34%), seguido por Bahia (23%) e Ceará (23%).

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"Do ponto de vista ambiental, incêndios de grande intensidade causam perdas irreversíveis à biota, especialmente em ecossistemas sensíveis e nas unidades de conservação", afirma Rocha. "Na caatinga, há uma ameaça mais latente, nas chamadas ASD [áreas suscetíveis à desertificação], com a possibilidade de incêndios recorrentes potencializarem o desencadeamento desse processo."

De acordo com o cientista, as regiões de Cabrobó, em Pernambuco, e Seridó, no Rio Grande do Norte e Paraíba, são exemplos de núcleos de desertificação que estão se expandindo. Canudos, na Bahia, é outro exemplo de ASD ameaçada pelo avanço do desmate.

O clima da caatinga é semiárido -mas um estudo recente do Inpe em parceria com o Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais) registrou, entre 1990 e 2020, o aparecimento de uma área definida como árida no norte da Bahia. Esse tipo de clima nunca tinha sido observado no país nas décadas anteriores.

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O estudo constatou que há uma tendência de aumento da aridez em todo o país, com exceção da região sul e do litoral do Rio de Janeiro e de São Paulo. Os pesquisadores concluíram que o semiárido tem crescido no país, avançando a uma taxa superior a 75 mil km², em média, a cada década desde 1960.

O aumento da aridez na caatinga é apontado por cientistas como uma das consequências das mudanças climáticas causadas pelas atividades humanas, o que aumenta as chances de desertificação.

Esse tipo de alteração provocaria a migração e extinção de espécies, além de impactar a disponibilidade de água e modificar parâmetros meteorológicos essenciais para a agricultura, com reflexos econômicos e nas seguranças hídrica e alimentar das populações locais.

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Para Washington Rocha, a atenção dada à conservação da caatinga ainda é "insuficiente e ineficiente".

"[Isso se deve] em grande parte devido ao desconhecimento das características do bioma, frequentemente associado à percepção de bioma sem vida", diz o pesquisador, afirmando que há uma falta de compreensão do processo de desfolhamento das plantas nas estações secas, uma adaptação das espécies àquele habitat.

"Essa falta de políticas públicas é demonstrada desde a flexibilidade regulatória, ao não reconhecimento do bioma como patrimônio nacional e ao baixo percentual de áreas protegidas em relação à área do bioma", aponta.

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