ONU
Chefiada pela ministra Cristiane Britto (Mulher, Família e Direitos Humanos), a delegação brasileira resumiu medidas da gestão e comentou alguns tópicos sem mencionar as falas dos demais países
Sede da ONU / Mat Reding/Unsplash
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Os direitos dos povos indígenas e os ataques a defensores de direitos humanos, ativistas ambientais e jornalistas estiveram entre os pontos de que o Brasil foi alvo de críticas na sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU que examinou o estado dessa área no país.
Chamado de Revisão Periódica Universal (RPU), o encontro desta segunda-feira (14), em Genebra, na Suíça, reuniu representantes de 122 países e integrantes do governo de Jair Bolsonaro (PL).
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Ao longo de mais de três horas, governos internacionais comentaram, de forma geral, a situação brasileira, expondo preocupações e indicando recomendações para serem adotadas nos próximos anos. A RPU é realizada a cada 4 anos e meio -o país já passou pelo processo nos ciclos de 2008, 2012 e 2017- e já estava programada para agora, coincidindo com o fim do período eleitoral e com outros fóruns que acabaram por reforçar o isolamento do presidente, a exemplo da COP27, no Egito, e do G20, na Indonésia.
Os povos indígenas foram citados por mais de 25 países, em falas de Estados Unidos, Reino Unido, França, Alemanha, Canadá, Austrália, Paraguai e Peru. Além de citações amplas sobre a necessidade de reforçar a proteção dessas comunidades, houve referências explícitas sobre a demarcação de terras -tema de resto ignorado na gestão Bolsonaro, que prometeu zerá-las.
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Diversas intervenções também recomendaram mais atenção para combater ataques a defensores de direitos humanos, ativistas ambientais e jornalistas. Em questões enviadas com antecedência, como parte da preparação para o encontro em Genebra, o Reino Unido foi direto.
"Após os assassinatos do jornalista britânico Dom Phillips e do indigenista brasileiro Bruno Pereira, quais os passos o governo do Brasil tomou e planeja tomar para combater o crime ambiental e fortalecer sua proteção aos defensores ambientais e de direitos humanos na Amazônia?", diz o texto. Os dois foram mortos em junho, no Vale do Javari (AM), em caso de grande repercussão internacional ante críticas à omissão das autoridades durante as investigações sobre o desaparecimento.
Os ataques ao trabalho de jornalistas -prática comum entre o presidente e seus aliados- receberam destaque em comentários, entre outros, de Holanda, EUA, França e Moldova que, citou ainda a recorrência de discursos de ódio no Brasil.
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"A comunidade internacional mostrou que tem acompanhado muito de perto todo o governo Bolsonaro, que representou um período de degradação dos direitos humanos", diz à reportagem Camila Asano, diretora de programas da Conectas Direitos Humanos.
Segundo ela, embora o tema da liberdade de expressão e de imprensa faça parte do debate de direitos humanos na ONU, a menção específica à atividade de jornalistas não é comum. "Isso mostra como a sociedade civil, inclusive aqueles que buscam mostrar pontos problemáticos, sofreu perseguição."
A coincidência da reunião com a troca de governo foi outro tópico presente -e também pouco usual. Mesmo tendo direito de falar por apenas um minuto, alguns representantes, como o Reino Unido e Moçambique, usaram o plenário para comentar a condução do processo eleitoral, que, em diversos momentos, chegou a ser questionado pelo atual presidente.
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A pandemia da Covid-19, área em que o governo é mal avaliado internacionalmente depois de quase 689 mil mortes, apareceu tanto nas recomendações para a mitigação dos efeitos na população quanto em menções de necessidade de fortalecimento do Sistema Único de Saúde.
Chefiada pela ministra Cristiane Britto (Mulher, Família e Direitos Humanos), a delegação brasileira resumiu medidas da gestão e comentou alguns tópicos sem mencionar as falas dos demais países.
No encerramento, Britto apontou ações de combate à fome, citando o programa Auxílio Brasil, de combate a violência contra crianças e mulheres e a administração da pandemia, apontando que o governo "disponibilizou vacinas para todos os brasileiros" -omitindo atrasos no processo e falas contrárias a ele do próprio presidente.
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Disse ainda que o combate à violência contra a população LGBTQIA+ foi uma prioridade, assim como o combate à corrupção, classificada por ela de "a maior violação de direitos humanos já registrada em nosso país" -também omitindo casos envolvendo integrantes do governo.
Ao concluir, declarou que "o maior diferencial do governo Bolsonaro foi o investimento na família brasileira, com a defesa e a proteção da vida desde a concepção".
A questão feminina, pelo viés da violência e do feminicídio e pelo direito ao aborto, teve maior espaço em relação a sessões anteriores. Na avaliação de Asano, além do melhor entendimento na ONU de que direitos sexuais e reprodutivos são direitos humanos, a repercussão de casos recentes de dificuldades de acesso ao aborto legal fez com que o assunto entrasse na lista de preocupações e recomendações.
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Nas falas, não só ações no âmbito do governo federal são mencionadas. Temas como a demarcação de terras indígenas, em tramitação no Supremo Tribunal Federal, ou a tentativa de mudança da Lei Antiterrorismo no Congresso mostram que a proteção dos direitos humanos é transversal no Estado. Mesmo na esfera estadual, questões como a atuação das polícias estiveram presentes.
"O racismo estrutural apareceu muito, sobretudo na fala de países africanos e muito ligado à violência policial. É um recado firme para governadores eleitos", diz Asano.
Muitas recomendações tiveram o caráter de indicação para a Presidência de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a quem, de fato, caberá a implementação do relatório final, que deve ser finalizado no fim de novembro. O novo governo terá até março para se posicionar e definir o que pretende acatar.
"Para a equipe de transição, é preciso entender que a comunidade internacional está muito preocupada com a necessidade de fortalecer os mecanismos de participação da sociedade civil, vistos como forma de fortalecer a democracia."
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