Economia

Especialistas veem economia pior com Bolsonaro do que com Dilma e indicam abandono do mercado

Também pesa a crise política gerada pela tentativa de reeleição do presidente, que tem colocado em descrédito o processo eleitoral e confrontado ministros do Supremo Tribunal Federal

Folhapress

Publicado em 20/08/2021 às 15:36

Atualizado em 20/08/2021 às 17:22

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Paulo Guedes, ministro da economia, ao lado de Bolsonaro. / Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

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O risco de um descontrole fiscal com aumento de gastos e perspectivas cada vez mais duras para a economia no ano que vem encontraram eco em uma piora do cenário externo, e o mercado já começa a falar em desembarque do governo de Jair Bolsonaro (sem partido).

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Para ficar em uma figura de linguagem cara ao presidente, é como se o casamento do governo com os investidores estivesse mais próximo do divórcio do que da lua de mel.

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Não é de hoje que os analistas têm precificado as dificuldades impostas pelo risco de uma deterioração do quadro fiscal, com a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) dos precatórios, e a inflação mais alta do que se antecipava.

Também pesa a crise política gerada pela tentativa de reeleição do presidente, que tem colocado em descrédito o processo eleitoral e confrontado ministros do Supremo Tribunal Federal.

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As preocupações dos investidores já se refletem na Bolsa de Valores brasileira e na cotação do dólar.

Nos mercados de renda variável, o Ibovespa, principal índice acionário do país, que até a última sexta-feira (13) acumulava um ganho de 1,83%, reverteu o sinal ao longo desta semana, apesar da alta registrada nesta quinta-feira (19). Agora, o índice acumula uma perda de 1,56% desde o início do ano. Só nesta semana, o Ibovespa acumula uma queda de 3,32%.

O dólar encerrou a sessão desta quinta em alta de 0,87%, a R$ 5,4220. Na semana a moeda americana sobe 3,4%. No ano a alta é de 4,5%.

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No exterior, parte da explicação para a piora das expectativas em relação à retomada da economia em um cenário pós-pandemia veio de dados fracos da China e dos Estados Unidos, desde a última segunda-feira (16).

O temor de um retrocesso econômico ganhou ainda mais força na terça (17), quando os Estados Unidos também reportaram dados aquém das expectativas: uma queda de 1,1% nas vendas do varejo em julho, ante a estabilidade esperada pelo mercado.

Outro ponto de influência nos mercados foi a ata da última reunião de política monetária do Federal Reserve (Fed, o banco central americano). Nela, a autoridade monetária sinalizou que o patamar de desemprego para que o suporte à economia seja reduzido pode ser atingido neste ano.

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Essa desaceleração no ritmo dos estímulos dados pelo Fed à economia americana, na prática, também pode refletir em um aumento das taxas de juros nos Estados Unidos - o que, para o Brasil e os mercados emergentes, pode significar menos investimento.

No cenário interno, a percepção é de incerteza e insegurança, que tendem a aumentar caso o governo não sinalize um comprometimento com as regras fiscais, aumente gastos e mantenha um ambiente de confronto com as instituições até a eleição de 2022.

Um sintoma disso é que as curvas de juros futuros para cinco e nove anos voltaram a atingir os dois dígitos nesta semana, recuperando patamares de três anos atrás.

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A deterioração da confiança do mercado no governo é visível e muitos já compreendem que a busca por uma reeleição por parte do presidente seria bastante preocupante do ponto de vista da agenda econômica, avalia a economista Zeina Latif.

"Às vezes, há um acúmulo de notícias negativas, mas o mercado demora a reagir por falta de um gatilho. Agora, esse gatilho veio lá de fora, com o Fed e um cenário externo não tão confortável, com a China desacelerando e o impacto nos preços de commodities. Isso acaba forçando o mercado a reavaliar o cenário interno", explica.

Segundo ela, cada vez mais o Brasil será afetado por ondas de volatilidade e, se antes o mercado apostava muito no governo Bolsonaro, hoje certamente não é assim. "É difícil falar sobre o mercado como uma entidade de opinião única, mas eu diria que antes havia mais unanimidade, como em 2018, e isso não existe agora."

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O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, é ainda mais enfático ao afirmar que o mercado já não espera que o governo entregue algo de relevante até as eleições do ano que vem.

Ele considera que o governo perdeu as condições de colocar em prática a política econômica às vésperas de uma disputa eleitoral que deve ser muito tensa. Essa combinação é ruim para o mercado, diz, e a taxa de câmbio deve continuar subindo, colocando pressão sobre a inflação e os juros.

"Com um discurso golpista, o presidente acaba prejudicando a imagem do país e a capacidade do investidor de fazer negócios, diz Vale. "O governo Bolsonaro, nesse sentido, acaba sendo pior que o da ex-presidente Dilma Rousseff. As dificuldades econômicas de agora são similares ao que havia no fim do governo da petista, só que com riscos institucionais que não existiam", afirma.

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"Hoje, com Bolsonaro criando crises, trazendo riscos fiscais crescentes e com a falta de equilíbrio na política, o mercado gradativamente vai abandonar o governo, o que já está acontecendo."

Ele ressalta que a perda de paciência com Bolsonaro não significa um embarque na candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que hoje lidera as pesquisas eleitorais. O mercado, na verdade, deve manter a expectativa por uma terceira via em 2022, aponta.

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