A prevalência da monogamia na sociedade, e no mundo ocidental de modo geral, está vinculada a vários aspectos da herança cultural / Freepik
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A pergunta mais repetida sobre o termo, segundo o Google, é ‘O que é a não-monogamia?’. Realizado pelo Google Trends, o levantamento, baseado nos últimos 12 meses, indica que o Brasil é o terceiro país do mundo com mais interesse de busca por não-monogamia, ficando atrás apenas da Austrália e do Canadá.
No Brasil, as pesquisas pelo assunto quadruplicaram nos últimos dois anos, com um crescimento de 280%, sendo que as principais perguntas sobre o tema, de acordo com os últimos 12 meses, são:
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1. O que é não-monogamia?
2. Como saber se sou não-monogamia?
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3. O que é pansexual não-monogâmica?
4. O que é monogamia e não-monogamia?
5. Como aceitar um relacionamento não-monogâmico?
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Juliana Braz Dias, professora do Departamento de Antropologia da Universidade de Brasília (UnB), define a monogamia, relacionamento que envolve exclusivamente duas pessoas, como apenas uma forma de arranjo conjugal.
De acordo com a professora, a prevalência da monogamia na sociedade, e no mundo ocidental de modo geral, está vinculada a vários aspectos da herança cultural, reproduzidos ao longo de séculos, como os valores propagados pelo cristianismo, a noção de amor romântico e a forma de regulamentar a transmissão de bens.
Enquanto isso, o antropólogo Antônio Pilão, que coordena o grupo de Pesquisa Políticas, Afetos e Sexualidades Não-Monogâmicas da Universidade de São Paulo (USP), explica que a monogamia é a forma de se pensar a organização familiar e econômica de um casal.
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Segundo Antônio, a monogamia é um tipo de relação pautado na ideia de que tanto em termos sexuais e familiares, instituição, organização, transmissão de propriedade privada, tudo é conectado a duas pessoas.
A não-monogamia pode ser entendida como uma forma de questionar a monogamia enquanto modelo predominante de organização social, além de ser vista como um mecanismo de controle da sexualidade e dos vínculos afetivos.
Esse conceito desafia normas culturais estabelecidas e abre espaço para novas formas de relacionamento.
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O termo engloba diferentes práticas e estruturas relacionais baseadas no consenso mútuo entre os envolvidos.
Entre essas práticas estão o amor livre, os relacionamentos abertos, o poliamor, a poligamia e o swing, cada um com suas particularidades e dinâmicas próprias.
Dessa forma, a não-monogamia se apresenta como uma alternativa para aqueles que buscam relações que rompem com a ideia de exclusividade, seja no âmbito afetivo, sexual ou ambos, permitindo maior liberdade e autonomia nas interações interpessoais.
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A necessidade da comunicação e da criação de acordos é um ponto muito importante ao entrar em uma relação não-monogâmica.
De acordo com o antropólogo, as fronteiras não ficam muito nítidas sobre o que é considerado problemático e o que não é para cada um dos envolvidos.
Antônio afirma que a questão da comunicação dos acordos parece ser fundamental, principalmente porque quando uma pessoa rompe a relação monogâmica e entra em uma relação não-monogâmica, ela não tem um guia muito claro sobre como construir a relação.
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Jaroslava Varella Valentova, professora antropóloga, destaca que a não-monogamia, assim como a monogamia, não é para todos.
Para a professora, algumas pessoas (e casais) preferem e estão satisfeitas em relacionamentos com um parceiro só, enquanto outras preferem se relacionar com mais indivíduos. Isso precisa ser analisado e bem pensado.
Cada um junto com o parceiro deveria analisar detalhadamente que tipo de personalidade, quais as necessidades e qual o nível de autocontrole, para poder assumir papel de parceria de um dos inúmeros tipos de relacionamento.
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Já para Juliana Braz Dias, não é possível afirmar que o ser humano é naturalmente monogâmico ou o contrário.
Segundo ela, o que faz parte da natureza humana é o desejo de estabelecer relações afetivas e/ou sexuais, mas é o contexto sociocultural que influencia nas escolhas, e às vezes determina, se e quando essas relações serão estabelecidas e sob que formato.
Os relacionamentos não-monogâmicos estão envoltos também na questão política e jurídica no Brasil.
De acordo com Antônio Pilão, os debates sobre o poliamor começaram no início dos anos 2000 no país, e ainda são recentes.
O professor afirma que o Estado brasileiro tem como preocupação garantir a monogamia como única forma de construção do casamento.
Previsto no artigo 235 do Código Penal, com penas que variam de um a seis anos para os envolvidos, a bigamia, casamento com mais de uma pessoa, é crime no Brasil.
Porém, em 2012, houve o reconhecimento do primeiro relacionamento poliafetivo na cidade de Tupã, no interior de São Paulo.
Em 2018, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) proibiu que cartórios no país registrem uniões poliafetivas, o que tornou inválida juridicamente a oficialização realizada em Tupã.
O Supremo Tribunal Federal (STF), além da decisão do CNJ, também rejeitou o reconhecimento de duas uniões estáveis simultâneas.
Para o professor Antônio Pilão, a decisão ocorrida em 2020 com repercussão geral marca um cenário complicado para relações não-monogâmicas.