Cubatão

Pedras sob viaduto da Nova Entrada de Santos causam indignação

Em São Paulo, Padre Júlio Lancelotti postou fotos quebrando as pedras a marretadas

Carlos Ratton

Publicado em 04/02/2021 às 07:00

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Colocação de pedras sob viaduto santista é vista como atitude higienista, desumana e impensável na / Thiago D'Almeida

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A colocação de pedras sob o Viaduto Paulo Gomes Barbosa (da entrada de Santos) para impedir que pessoas em situação de rua se instalem no local - iniciativa igual à da Prefeitura de São Paulo - causou indignação de alguns formadores de opinião e a Prefeitura alega que é para evitar permanência e trânsito de pedestres e infrações de trânsito no local.

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"A questão social está cada vez pior é um grande desafio. Não temos políticas públicas e sociais eficientes. Acredito que essas pedras não fazem grande diferença no macro mas, se realmente a intenção foi apenas impedir que pessoas se abriguem ali, realmente é cruel e fere todos os princípios de Direitos Humanos em uma cidade que se diz acolhedora", diz a advogada Letícia Giribelo.

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O advogado e ativista em Direitos Humanos Rui Elizeu de Matos Pereira afirma que a medida faz com que a edificação se torne um triste monumento ao higienismo. Os argumentos da Prefeitura "são risíveis, pois admite que sua responsabilidade está sendo realizada por pedras. Mostra a incapacidade de amparar os moradores de rua, preferindo expulsá-los de local que os proteja ao menos de uma forte chuva, de ventos e do frio".

O arquiteto urbanista Rafael Ambrósio acredita que "é de uma desumanidade brutal. Além de não desenvolver qualquer política de assistência social efetiva para lidar com o problema, ações como essa visam apenas tirar das vistas um problema que nossa sociedade só enxerga quando ocupam espaços nobres das cidades".

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SEM NOVIDADE.

Doutor em Planejamento Urbano, professor e pesquisador, José Marques Carriço diz que essa estratégia não é nova em Santos em que há bancos de praça em formato irregular para evitar que a pessoa deite. "É uma forma de afastar a pobreza dos olhos. Nossa sociedade gera pobreza de forma estrutural ao mesmo tempo se incomoda e se culpa. Então, a ideia é tornar a miséria invisível. O poder público deveria eliminar a miséria e não os miseráveis", dispara.

O cientista político Rafael Moreira confirma que a atitude não é nova nem na Capital. "No entanto, a Imprensa e as redes sociais estão atentas. Também não é restrita ao poder público. Proprietários de imóveis costumam colocar lanças e outros obstáculos. A desigualdade vem crescendo e as redes de assistência social não estão dando conta de dar tratamento humanizado. É triste e não tenho dúvida que muitas pessoas ainda apoiam esse tipo de medida. Ninguém quer resolver o problema, apenas tirá-lo do raio de visão".

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O professor guarujaense Valter Batista garante que políticas sociais não dialogam o desenvolvimento urbano. "O que deveria ser compreendido como uma forma de resistência, tentativa de sobreviver, se transforma em algo a ser exterminado. O próprio termo moradores de rua carrega uma simbologia eugenista e naturalizante. Ninguém mora senão em uma moradia. Rua não é casa, assim como não o são os viadutos. A questão é que não há políticas públicas. Tirá-los debaixo das pontes seria torná-los ainda mais invisíveis", acredita o educador.

O advogado vicentino Flávio Viana afirma que a 'arquitetura da exclusão' fere a dignidade do ser humano. "É uma forma de apartheid. Vejo até como uma exclusão racial, social e política. Esse caso do viaduto é clássico. Querem remover da entrada de Santos as pessoas carentes e de rua para dar uma impressão de uma outra cidade", afirma.

O jurista e professor Vicente Cascione é direto: "Só serve para esconder a chaga social presente nos lugares muito visíveis diante da passagem de grande número de pessoas. A Prefeitura oculta os problemas, desloca-os para outros locais e não os soluciona por absoluta falta de competência de pseudos gestores despreparados para cuidar dos próprios umbigos. Assim age uma gestão fictícia, eleita pela grande maioria dos habitantes da Cidade".

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CÂMARA.

As vereadoras Débora Camilo (Psol) e Telma de Souza (PT) não se conformam.

"É deplorável que ao invés de pensar em políticas públicas, a solução apresentada por tucanos em São Paulo e Santos, cidade que carrega o lema 'terra da caridade e da liberdade', seja colocar pedras, piorando a situação absurda de pessoas vivendo sem um teto! Uma ação higienista, desumana e impensável para quem tem compromisso com a vida. Não é possível que a solução seja penalizar quem já está em vulnerabilidade social extrema", afirma Débora.

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"É inadmissível que qualquer cidade do mundo adote práticas higienistas, sobretudo Santos, cujo lema é Liberdade e Caridade. Minha vida é pautada na construção de políticas que combatam a exclusão. Realizamos audiências públicas, inclusive com a presença do Padre Júlio Lancellotti, para ampliação do Consultório na Rua, além de uma abordagem humanizada. Tenho projeto de lei que estabelece que os empreendimentos privados tenham como contrapartida a revitalização de áreas vulneráveis", afirma Telma.

CAPITAL.

Na capital paulista, o padre Júlio Lancelotti, conhecido por seu trabalho social com pessoas em situação de rua e carentes, postou em sua conta no Twitter uma foto quebrando as pedras a marretada e escreveu. "Indignação diante da opressão. Marretada nas pedras da injustiça", escreveu.

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Antes da iniciativa do padre, a Administração Bruno Covas (PSDB) já havia se arrependido punindo o responsável pela iniciativa e iniciando a retirada das pedras para tentar minimizar o desgaste público da já conhecida 'arquitetura da exclusão'.

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