Antonio Pequeno mora com a mãe Deise numa pequena casa com pouca iluminação e difícil acesso até para não especiais / Nair Bueno/Diário do Litoral
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Se a falta de habitação decente é um problema sério na Baixada Santista, imagina para quem possui necessidades especiais com mobilidade reduzida em uma comunidade com sérios problemas de infraestrutura urbana.
O Diário levantou esta semana um caso em Santos que, infelizmente, ainda está longe de ser isolado e reflete o verdadeiro martírio ao qual centenas de cidadãos e cidadãs sofrem diariamente para serem incluídos na cidade que se 'gaba' por ser boa de se viver.
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Antônio Rodrigo Vitorino Pequeno tem 31 anos e mora, junto com a mãe, Deise Vitorino Pequeno, num cômodo - sala/quarto, cozinha e banheiro - de pouco mais de 20 metros, na Vila Pantanal.
Além de problemas físicos, Antônio tem raciocínio de uma criança de oito anos, segundo a mãe, que garante o sustento de ambos por conta de uma ajuda federal, oriunda da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), na ordem de um salário mínimo - R$ 1.100,00.
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"Não pagamos luz, água e aluguel. Recebemos uma cesta como doação, frutas e legumes. Ainda assim nossa vida é muito difícil, pois meu filho fica preso a uma cadeira de rodas em função da falta de acessibilidade das vielas a qual vivemos. Quase não vê a luz do dia", afirma Deise.
SOCIEDADE
A presidente da Sociedade de Melhoramentos da Vila Pantanal, Ana Bernarda dos Santos, que também se locomove por intermédio de uma cadeira de rodas, só que motorizada, explica que as vielas estreitas e sem sol, calçamento irregular, iluminação pública precária, sistema de esgoto insuficiente e outros problemas urbanos fazem com que a Vila Pantanal seja totalmente insalubre. Há dificuldades de acesso até para o corpo de bombeiros e ambulâncias.
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"Existe dezenas de pessoas especiais e idosos na mesma situação de Antônio por conta da falta de investimento urbano na Vila Pantanal. É preciso urgente alargar as ruas e desenvolver um projeto de habitação que permita ampliação dos imóveis. Não adianta transferir moradores para prédios habitacionais porque a maioria não possui renda suficiente para se manter e acaba voltando", explica Ana Bernarda, responsável pela coleta mensal de centenas de cestas básicas para as famílias do lugar.
CADASTRAMENTO
Para sensibilizar os órgãos públicos e autoridades regionais, Ana Bernarda e a advogada Gabriela Ortega, uma das representantes da Rede Nacional de Advogadas Populares (RENAP), estão realizando um cadastramento das famílias para mensurar a situação socioeconômica da comunidade e buscar melhorias.
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Para Gabriela, é urgente um projeto de urbanização e regularização fundiária. "As pessoas estão morando em condições indignas e presas por conta da falta de acessibilidade. Até o direito à água é dificultado na cidade em que a Prefeitura propaga ser a número um em saneamento básico", afirma.
Lembra ainda a advogada que a Administração se baseia em dados de 2010 para aferir o déficit habitacional. "É preciso de um levantamento socioeconômico, principalmente após pandemia. E isso estamos fazendo. Centenas de famílias moram aqui por extrema necessidade. Será que não seria mais econômico e viável regularizar e urbanizar? Moradia deveria ser amplamente discutida", finaliza.
CONDEFI E DEFENSORIA RECONHECEM SITUAÇÃO
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O presidente do Conselho Municipal de Pessoas com Deficiência (Condefi) de Santos, Francisco José Moreira da Silva Júnior, revela que é preciso urgente um projeto de urbanização para a Vila Pantanal tornando-a acessível.
"Não se pode pensar em uma única pessoa com deficiência senão estaremos enxugando gelo nas comunidades que hoje abrigam muitas pessoas em situação de pobreza. Precisamos de uma urbanização para que essas pessoas tenham o seu direito de ir e vir garantidos pela nossa constituição", afirma.
No final do ano passado, o Diário mostrou a situação do ex-vigilante José Roberto Rosa da Silva, de 59 anos, cego e esquecido na remoção das cerca de 140 famílias que habitavam submoradias localizadas sobre o Rio Furado, para a realização de serviços de drenagem. As pessoas foram levadas para o Conjunto Habitacional Caneleira IV.
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Com locomoção limitada, o ex-vigilante passa o maior tempo sentado, apoiado em sua bengala, de frente ao que restou dos barracos retirados do entorno de sua simples moradia, cujo acesso é uma passarela mal construída pela Prefeitura, após Silva ter caído e quase morrido ao tentar andar sobre uma antiga ponte que foi danificada nas obras para dar melhor vazão às águas.
O barraco de um cômodo de José Silva fica na Travessa São Jorge, 1.130, na Alemoa. Sua renda não chega a R$ 900,00 - menos de um salário mínimo - gasta boa parte com remédios.
JUSTIÇA
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O caso do ex-vigilante já está na Defensoria Pública. O defensor Thiago Santos de Souza lembra que pessoas com deficiência e idosos têm prioridade para atendimento em programa habitacional, devendo receber valores de locação social, até a efetiva regularização junto a Cohab Santista, que executa a política pública habitacional em Santos.
Thiago está defendendo o jovem especial Elivaldo dos Santos Júnior, que está inserido no programa tarifa social. Ele possui hidrocefalia. Sua família - mãe e irmão - vivem com pouco mais de um salário mínimo. Hidrocefalia é, de forma genérica, a acumulação de líquido no interior da cavidade craniana que pode causar lesões no tecido cerebral e aumento e inchaço do crânio.
Elivaldo não pode sofrer corte de água, desde que não gaste um limite de uso determinado pela Justiça. O jovem possui cama hospitalar elétrica, cadeira de roda motorizadas e alguns insumos como medicações e fraudas, tudo conquistado com a ajuda da Defensoria.
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No entanto, tinha sentença de primeiro grau favorável de moradia contra o Município e a Cohab, que recorreram à decisão e acabaram conseguindo a retirada do direito à moradia.
PREFEITURA
Sobre a área ocupada irregularmente, denominada Vila Pantanal, a Prefeitura garante que está realizando estudos, buscando viabilidade para implantação de habitação de interesse social.