Cotidiano

Venda de imóveis da União para empresa pode ter provocado rombo de R$ 17 milhões

Os imóveis ficam na Avenida Ana Costa, números 80 e 89, na Vila Mathias, e foram arrematados em leilão online

Nilson Regalado e Carlos Ratton

Publicado em 18/12/2023 às 08:30

Atualizado em 18/12/2023 às 08:51

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No total, os dois terrenos ocupam uma área de 4.356 metros quadrados e foram arrematados por R$ 6 milhões 450 mil / Nair Bueno/ DL

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A alienação (transferência de propriedade) de dois terrenos da União para a Construtora e Incorporadora Macuco pode ter causado um prejuízo milionário aos cofres públicos. Os imóveis ficam na Avenida Ana Costa, números 80 e 89, na Vila Mathias, e foram arrematados em leilão on line promovido no final do Governo Bolsonaro. No total, os dois terrenos ocupam uma área de 4.356 metros quadrados e foram arrematados por R$ 6,45 milhões. Levando-se em consideração apenas o valor venal dos dois terrenos, com base na Planta Genérica de Valores do Município, a compra dos dois imóveis pode ter causado um prejuízo de R$ 2,7 milhões à União. Porém, esse prejuízo aos cofres do Governo Federal pode chegar a R$ 15 milhões se for considerado o valor de mercado do metro quadrado na Avenida Costa, na altura da Vila Mathias.

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Some-se a isso, mais R$ 2 milhões que deixariam de ser recolhidos aos cofres municipais a título de compensação pela mudança na regra para uso do solo. A transação foi revelada ontem, com exclusividade, pelo Diário do Litoral.

Ocorre que a Lei 14.011, sancionada por Jair Bolsonaro em 2020 sob o pretexto de facilitar a venda de imóveis da União transferiu a incumbência de definir o valor do bem a ser arrematado para o próprio interessado na compra. Mais: a legislação federal, até agora em vigor, ainda autoriza um desconto de 25% no preço do bem a ser arrematado.

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Além do prejuízo aos cofres públicos, os dois terrenos arrematados pela Construtora Macuco estão inseridos em uma Zona Especial de Interesse Social (ZEIS). E isso pressupõe que eles só podem ser usados para construção de moradias populares, o que limita o uso dessas áreas. 

Naquela região da Cidade, imóveis com frente para a Ana Costa têm valor venal de R$ 2.108,00 por metro quadrado. Mas, segundo especialistas no mercado imobiliário consultados pelo Diário do Litoral, o preço de mercado na altura da Vila Mathias beira os R$ 5 mil por metro quadrado.

Amparada por duas alterações nas legislações de uso do solo promovidas pelo prefeito Rogério Santos no final de 2022, a Construtora e Incorporadora Macuco propôs uma contrapartida ao Município. A medida visa remover os dois terrenos da área de ZEIS, ampliando, assim, as possibilidades de negócios nas duas áreas.

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Conforme documentos a que o Diário do Litoral teve acesso, a empresa recolheria R$ 3,25 milhões aos cofres municipais a título de compensação pela remoção da área de ZEIS. Por sugestão da incorporadora, esses recursos, em tese, poderiam ser usados na aquisição de outra área, na Zona Noroeste, para fins de construção de moradias populares.

Caminho aberto

Com esses argumentos, a Construtora Macuco protocolou em março um pedido para que os dois terrenos arrematados meses antes no leilão on line pudessem ser usados para outras finalidades, que não a construção de habitações populares. Assim, o caminho estaria aberto para lucros maiores com a edificação, por exemplo, de torres com imóveis de alto padrão.

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As pretensões da empresa deram origem ao Procedimento Administrativo número 11617-2023-39, aberto pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (Sedurb). Desde então, o tema passou a ser debatido também pelo Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano (CMDU).

As alegações apresentadas pela Construtora Macuco fazem parecer que os valores pagos à União, somados à contrapartida oferecida ao Município, tornam a transação vantajosa para o interesse público. E que a soma dessas duas quantias supera o valor venal dos dois imóveis.

Porém, não é bem assim.

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Segundo documentos a que o Diário do Litoral teve acesso, a Secretaria de Desenvolvimento Urbano teria utilizado um valor venal incorreto para calcular o montante da contrapartida a ser paga pela empresa ao Municipal. E mais vantajoso para a construtora.

Só aí, o prejuízo à sociedade santista poderia atingir mais de R$ 2 milhões.

Como o terreno localizado no número 89 da Ana Costa também tem acesso pela Rua Júlio Conceição, a Sedurb teria adotado o valor venal do metro quadrado desta via, que é de R$ 1.940,00, ignorando que o imóvel fica de frente para a avenida. E que, portanto, tem valor venal mais alto. 

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Transação suspensa

Diante de tantas dúvidas quanto à legalidade e boa-fé da transação, na última segunda-feira (11) a juíza Fernanda Menna Pinto Peres, da 1ª Vara da Fazenda Pública de Santos, concedeu “tutela de emergência”. A decisão suspendeu imediatamente qualquer deliberação acerca do Procedimento Administrativo número 11617-2023-39.

A liminar atendeu mandado de segurança protocolado pela Defensoria Pública do Estado (DPE). Em síntese, a DPE alegou que tanto a Secretaria de Desenvolvimento Urbano quanto o Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano teriam negado o acesso aos documentos apresentados pela construtora e às atas das reuniões que debateram a possível “desgravação” dos dois terrenos da ZEIS Vila Mathias.

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E a juíza considerou que isso fere tanto o preceito constitucional da transparência nos atos da Administração Pública quanto o direito de acesso à Justiça por parte das populações mais vulneráveis, como os sem-teto e os moradores de sub habitações, representados legalmente pela DPE.

Questionada pelo Diário do Litoral na última sexta-feira, a Prefeitura disse que acatou a decisão judicial. No entanto, a Administração Municipal não quis antecipar se irá propor alguma medida jurídica com o propósito de derrubar a liminar.

Já a Construtora Macuco alegou que ainda não havia sido “notificada da decisão judicial e que a iniciativa está ainda no âmbito interno da CMDU”. No entanto, a Macuco afirmou que “acredita que a Prefeitura está atendendo todos os ritos previstos na lei aprovada”, referindo às mudanças no uso do solo sancionadas pelo prefeito Rogério Santos no final de 2022. 

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