No primeiro momento, todos os 200 detidos foram levados ao Palácio da Polícia, na Avenida São Francisco / Rodrigo Montaldi/Arquivo DL
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Além do santista Rubens Paiva, retratado no filme que concorre ao Oscar, estima-se que outras 500 pessoas tenham sido vítimas de violência em Santos por parte de agentes da ditadura militar. As pesquisas conduzidas pela jornalista, advogada, escritora e professora universitária Lídia Maria de Melo indicaram que só no primeiro dia após o golpe militar de 1964, cerca de 200 pessoas foram detidas em Santos.
A operação começou às 8h30 do dia 1º de abril e contou com militares de várias unidades da Baixada Santista. Armados com metralhadoras e fuzis, eles invadiram e devassaram 16 sindicatos locais, duas delegacias de sindicatos nacionais e mais quatro órgãos ligados ao Porto de Santos.
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Nesse primeiro momento, todos os 200 detidos foram levados ao Palácio da Polícia, na Avenida São Francisco, no Centro. Lá funcionava a antiga Cadeia Pública de Santos e, segundo a jornalista, também era lá a sede da Delegacia de Ordem Política e Social (DOPS).
Dentre essas 200 pessoas, metade eram dirigentes sindicais e associados dos sindicatos, a maioria trabalhava no Porto. Mas, havia também profissionais de outras áreas, como médicos, dentistas, jornalistas e advogados que prestavam serviço aos sindicatos, além de funcionários públicos do Serviço Municipal de Transporte Coletivo (SMTC) e dirigentes do Sindicato dos Carris Urbanos, que eram os bondes.
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Também foram presos funcionários da Refinaria Presidente Bernardes, de Cubatão, e da Companhia Siderúrgica Paulista, a antiga Cosipa, hoje rebatizada como Usiminas. Até agricultores de Mongaguá, Itanhaém e Peruíbe e de municípios do Vale do Ribeira, que se organizavam com a ajuda dos sindicatos de Santos para a defesa de seus direitos nas Ligas Camponesas, acabaram presos.
“Então, esse número de 200 pessoas, tanto pode ter aumentado quanto diminuído, porque ao longo dos dias seguintes, investigadores da DOPS, membros da Polícia Marítima e da Capitania dos Portos, sob o comando do capitão de mar e guerra Júlio de Sá Bierrenbach (capitão dos Portos), iam fazendo novas apreensões, assim como iam liberando alguns dos detidos inicialmente”, pondera Lídia.
“Quem ficou no Palácio da Polícia, onde funcionava a DOPS, foi trancafiado em celas que não tinham espaço para tanta gente. Eles se revezavam. Uns ficavam de pé, enquanto outros ficavam sentados ou deitados. Não recebiam comida, não tinham colchão, dormiam no chão duro, sujo e frio, não tinham direito a banho, não tinham roupa para trocar, não tinham assistência de advogado e as famílias não sabiam onde eles estavam”, relata a pesquisadora.
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“Alguns ficaram dias e semanas lá. Outros passaram meses. Frequentemente algum agente do DOPS chamava algum deles e levava. Passado um tempo, ia buscar outro e dizia: ‘Aquele já foi’. E os presos logo pensavam que a pessoa tinha morrido. Então, gerava um pânico sobre o que aconteceria com o próximo”, completa a escritora.
Importante: nesse primeiro momento sequer havia luta armada contra a ditadura que acabara de se estabelecer no País após a deposição do presidente João Goulart (1961/1964). Portanto, os detidos eram levados ao cárcere apenas por defenderem um ideário de defesa dos trabalhadores. Muitos também participavam de partidos políticos considerados inimigos por parte dos militares que tomaram o poder após o golpe.