Cotidiano

'Revolta reprimida': psicólogo de Santos fala sobre Larissa Manoela e relação pais e filhos

Cristiano Ávila, que também é neurocientista, analisa o assunto, que é o mais comentado da semana

Jeferson Marques

Publicado em 16/08/2023 às 12:00

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A atriz Larissa Manoela / Reprodução/Instagram

O caso da relação entre a atriz Larissa Manoela e seus pais, Sílvana e Gilberto, ganhou a mídia nos últimos dias após a exposição do descontentamento dela com a administração de seus bens financeiros. A briga foi assunto no Fantástico do último domingo (13/08) e, imediatamente, tomou também as redes sociais. E a Reportagem do DL procurou o psicólogo e neurocientista de Santos, Cristiano Ávila da Silva, que fez uma leitura do caso e da relação entre pais e filhos.

Confira abaixo como foi o bate-papo:

DL - O que o rompimento de relação com os pais pode trazer de negativo para uma jovem de 22 anos, que sempre morou com eles? E se for uma relação tóxica, melhor romper mesmo?

Cristiano Ávila: Romper uma relação com os pais pode trazer alguns desafios e impactos negativos para uma jovem de 22 anos, especialmente se ela sempre morou com eles. Pode haver uma sensação de perda emocional, insegurança financeira e a necessidade de desenvolver novas habilidades práticas para viver de forma independente. No entanto, se a relação com os pais é tóxica e causadora de sofrimento emocional contínuo, pode ser melhor romper essa relação para preservar a saúde mental e emocional. É verdade que Larissa Manoela começou sua carreira profissional desde a infância e, nesse caso, pode ser considerado aceitável que seus genitores administrem os recursos adquiridos por ela. No entanto, à medida que ela cresce e se torna mais independente, é fundamental que ela assuma a responsabilidade por sua própria vida, incluindo a gestão de seus recursos financeiros. Perceba, a autonomia é uma competência importante para o desenvolvimento pessoal e a autoresponsabilização é um aspecto crucial nesse processo. Se houve falta de incentivo à autonomia e responsabilização por parte dos pais, isso pode gerar insatisfação e até mesmo revolta reprimida, o que poderia levar ao rompimento de relações. Cabe ressaltar que o relacionamento entre pais/responsáveis e filhos é único para cada família, e os detalhes específicos da situação de Larissa Manoela não estão disponíveis para nós. Portanto, a análise completa do caso requer uma compreensão mais aprofundada da dinâmica familiar envolvida.

DL - Os pais também sofrem com este rompimento? Lidam de forma diferente?

Cristiano Ávila: Os pais também podem sofrer com o rompimento da relação, mas a forma como lidam com isso pode variar de acordo com sua personalidade e perspectiva. Alguns pais podem sentir culpa e tristeza, enquanto outros podem agir de forma defensiva ou até mesmo negar a gravidade da situação. Cada pai pode reagir de maneira diferente, dependendo de suas próprias experiências e capacidades emocionais. Entendo que é fundamental que os pais exerçam seu papel não apenas na educação, mas também no preparo dos filhos para a vida. Isso inclui fornecer orientação, ensiná-los habilidades práticas, ajudá-los a desenvolver responsabilidade e autonomia. Ao treinar os filhos para a vida, os pais podem ensinar valores, promover o desenvolvimento de habilidades sociais e emocionais, incentivar a tomada de decisões e a resolução de problemas, além de transmitir conhecimentos importantes para o seu futuro. Essas ações contribuem para que as crianças e os adolescentes se tornem adultos autônomos, capazes de lidar com os desafios do mundo. No entanto, é importante lembrar que o processo de educação e treinamento envolve a participação ativa dos pais, mas também permite que os filhos ganhem experiência, cometam erros e aprendam com eles. O equilíbrio entre orientação e o desenvolvimento da independência é fundamental para o crescimento saudável dos filhos.

No geral, os pais têm um papel fundamental na preparação dos filhos para a vida, sendo essencial que eles se dediquem a essa responsabilidade de forma equilibrada e adaptada às necessidades de cada criança ou adolescente. É verdade que, se os pais não forem capazes de evoluir e se adaptar às mudanças e necessidades dos filhos à medida que eles crescem, isso pode levar a uma relação tóxica. É importante reconhecer que os filhos têm o direito e a necessidade de desenvolver sua própria identidade, assumir responsabilidade por suas ações e tomar suas próprias decisões. À medida que os filhos crescem, é saudável e necessário permitir que eles sigam adiante e se tornem independentes. Isso faz parte do processo natural de amadurecimento. Os erros e acertos fazem parte do aprendizado e do desenvolvimento pessoal, e é importante que os filhos tenham a oportunidade de enfrentá-los e assim se tornarem adultos maduros e aptos para educarem seus próprios filhos, um ciclo geracional.

DL - Como lidar com pais que não aceitam que seus filhos sigam trajetórias diferentes das que eles entendem ser a correta?

Cristiano Ávila: Lidar com pais que não aceitam trajetórias diferentes é um desafio complexo. É importante lembrar que cada pessoa tem o direito de seguir seu próprio caminho e tomar decisões de vida que sejam melhores para si. A comunicação aberta e honesta pode ser uma estratégia eficaz para tentar fazer com que os pais entendam as razões por trás das escolhas e decisões do filho. Além disso, buscar apoio externo, como terapia familiar ou aconselhamento, pode ajudar no processo de negociação e aceitação mútua.

DL - Quando o assunto se torna público, ou seja, chega ao conhecimento de pessoas de fora, isso pode prejudicar o processo de lidar com essa quebra de relações?

Cristiano Ávila: Quando uma quebra de relação se torna pública, isso pode adicionar uma pressão adicional e complicar o processo de lidar com essa situação. A exposição aos olhares e julgamentos de outras pessoas pode aumentar o estresse e a ansiedade, tornando importante estabelecer limites e proteger a privacidade pessoal. É fundamental buscar apoio emocional de amigos próximos, familiares confiáveis ou profissionais qualificados para lidar com os desafios que possam surgir.

DL - Existe uma relação ideal entre pais e filhos, ou uma "fórmula" para isso?

Cristiano Ávila: Não existe uma relação ideal ou uma fórmula específica para a relação entre pais e filhos, pois cada família é única e possui suas próprias dinâmicas. No entanto, uma relação saudável entre pais e filhos é baseada em comunicação aberta, respeito mútuo, aceitação, confiança e apoio emocional. É importante que os pais estejam dispostos a entender e respeitar as escolhas dos filhos, desde que não sejam prejudiciais. O diálogo aberto e a empatia são essenciais para construir uma relação firme e amorosa.

DL - Um rompimento deste aos 22 anos pode gerar traumas permanentes?

Cristiano Ávila: Um rompimento aos 22 anos pode causar traumas permanentes, mas isso pode variar de pessoa para pessoa. Cada indivíduo processa o rompimento de maneira diferente, dependendo de suas experiências de vida, personalidade e recursos internos. Neste caso específico, entendo que a situação pode levar à formação de feridas emocionais que, se não forem tratadas, poderão levar a várias consequências emocionais. Veja, 80% das feridas emocionais vêm de relacionamentos, o que pode afetar significativamente o emocional de uma pessoa. É importante entender que as feridas emocionais, se não tratadas, podem levar a experiências traumáticas. Nossa mente trabalha com programações emocionais que respondem a um sistema de crenças estabelecidas, que podem ser fortalecedoras ou limitantes. Esse sistema de crença interfere poderosamente nos comportamentos que emitimos, é por isso que muita gente faz coisas que não quer fazer, mas não consegue evitar. O comportamento muitas vezes é resultado de crenças limitantes e pode nos levar a tomadas de decisões que fogem completamente à razão. Saber como a mente funciona é importante para se ter uma vida saudável, saúde mental, e isso, dinheiro nenhum paga. Você pode ter um império, mas se faltar saúde mental, isso de nada valerá. E certamente, neste caso que está em alta no momento, a relação de Larissa Manoela responde a esse ciclo invisível do problema que muitos não percebem. Para ilustrar, se pudéssemos dividir a mente dentro de um modelo neurocientífico, dividiríamos a mente em três partes: mente consciente, mente inconsciente e mente subconsciente. A mente inconsciente é aquela parte automatizada que controla nosso sistema imunológico e tudo que é de vital importância para a nossa existência. Nessa automação, somos mantidos vivos sem precisar pensar ou dar atenção ao ciclo vital. Já pensou se você tivesse que pensar no batimento cardíaco enquanto lê este texto? A mente consciente é aquela que nos conecta com o princípio da realidade e nos fornece recursos cognitivos para lidar com as situações do dia a dia. Ela nos coloca no aqui e agora para ser vivido. Quando, por algum motivo, a pessoa não se vê provida de capacidade para enfrentar suas situações diárias, é aí que o problema começa a acontecer. Quando uma pessoa se percebe vulnerável, sem recursos internos para enfrentar suas situações, é bem possível que, a partir desse ponto, comece a adoecer psicologicamente e emocionalmente. Chamo isso de capacidade de enfrentamento. Sem essa capacidade ativa na psicodinâmica, é certo que a pessoa irá entrar em sofrimento, seja em crises de ansiedade, alterações de humor, estados depressivos e vários outros sintomas, que podem se intensificar caso não sejam tratados. A mente subconsciente é a soma de todas as nossas vivências. Somos a soma de tudo que vivemos ao longo do nosso desenvolvimento. É aqui que se abre a porta para o desenvolvimento de programações emocionais que irão interferir nos padrões comportamentais. Voltando à questão, sim, é recomendável que, caso sinta que o rompimento tenha causado um trauma significativo, a pessoa busque apoio profissional, como terapia, para auxiliar no processo de cura e aprendizado, fechando essas feridas emocionais o quanto antes, pois feridas emocionais são lesões emocionais que podem resultar de experiências traumáticas ou decepcionantes. Assim como feridas físicas, as feridas emocionais também requerem cuidados e atenção para facilitar a cura.

DL - É possível uma reconciliação após um rompimento cheio de acusações, agressões verbais e de isso ter se tornado público?

Cristiano Ávila: A reconciliação após um rompimento cheio de acusações e agressões verbais, e ainda com o fato de ter se tornado público, pode ser extremamente desafiadora. Requer esforço mútuo, vontade de se desculpar e mudar padrões de comportamento tóxicos. No entanto, a possibilidade de uma reconciliação depende da disposição e comprometimento de ambas as partes em trabalhar na reconstrução da confiança e no estabelecimento de limites saudáveis. É importante lembrar que a reconciliação nem sempre é possível ou saudável, e a prioridade deve ser sempre o bem-estar emocional e mental de todos os envolvidos.

Para finalizar, Ávila dá alguma dicas para as pessoas lidarem com feridas emocionais.

1. Reconheça e aceite suas emoções: Permita-se sentir e expressar suas emoções, mesmo as dolorosas. A negação ou repressão das emoções pode prolongar a cicatrização.

2. Busque apoio: Converse com amigos, familiares ou um profissional de saúde mental para compartilhar suas experiências e buscar apoio emocional.

3. Pratique o autocuidado: Dedique tempo para cuidar de si mesmo. Isso pode incluir atividades que lhe tragam alegria, como hobbies, meditação, exercícios físicos, entre outros.

4. Aprenda a perdoar: O perdão pode ser um processo emocionalmente libertador. Isso não significa esquecer o que aconteceu, mas sim liberar a mágoa e o ressentimento para seguir em frente.

5. Procure terapia: Terapia ou aconselhamento profissional pode ser benéfico para ajudar a tratar e curar as feridas emocionais. Um terapeuta qualificado pode fornecer orientação e ferramentas para lidar com o trauma.

6. Pratique a resiliência: Aprenda a se adaptar e se recuperar das adversidades. Desenvolva estratégias de enfrentamento positivas e resilientes para ajudar a superar as feridas emocionais. Lembrando que cada pessoa é única e os processos de cura variam, então é importante encontrar as estratégias de autocuidado e suporte que funcionem melhor para você.

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