Cotidiano

O drama de uma idosa em Santos

Sem condições de cuidar da mãe, filho busca vaga em casa de repouso. Assistente social do Centro Espírita de Caridade Dr. Luiz Monteiro de Barros auxiliou dona Janette

Publicado em 19/07/2015 às 10:35

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Eles só têm um ao outro. Mãe e filho vivem juntos em um pequeno quarto localizado em um cortiço na região do Mercado Municipal, em Santos. Há quatro meses, ela sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC) e perdeu o movimento das pernas. Vive em uma cama e necessita de cuidados especiais. No início do mês, ele foi preso por não pagar pensão alimentícia ao filho de 11 anos. Desde então teve início o drama da família, que convive com a pobreza e o difícil acesso aos direitos e serviços públicos.

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“Não tenho mais família. Só ela e meu filho que mora com a mãe dele. Fiquei 10 dias preso por causa da pensão. Os vizinhos que olharam ela. Quero trabalhar para pagar a pensão, mas se eu trabalhar quem vai ficar com ela? Cuido dela e não pago a pensão e vou preso de novo ou não cuido dela e trabalho para poder pagar a pensão? Eu não sei mais o que fazer”, disse Nicolaos Birckoltz, de 41 anos.

Ele mora com a mãe, Janette Dorothy Birckoltz, de 73 anos, no quarto de um cortiço com banheiro coletivo. Pagam R$ 500,00 de aluguel do cômodo. A única fonte de renda é o benefício da idosa, R$ 788,00 (um salário mínimo). O que sobra é gasto em alimentação. “Hoje comemos arroz e feijão puro. O que sobra é para comprar comida. Não posso trabalhar e deixar ela nessas condições. Mês que vem vou ter que pagar a pensão do dinheiro dela (R$ 300,00) para não ir preso, mas também não é justo. Preciso urgente que arrumem uma casa para ela ficar e cuidarem dela”, desabafa o filho.

Nos 10 dias em que ficou detido, a vizinha de Nicolaos cuidou da mãe dele. Alessandra de Fátima Teodoro disse que quando soube da prisão do vizinho, ela passou a cuidar da idosa, mas a situação já estava complicada. “Estava com muitas feridas embaixo do seio e nas partes íntimas porque ela precisa de cuidados. Colocamos ela na cadeira e demos banho e comida. Ela não reclama de nada, coitada. Procurei o centro que fica aqui na frente para que alguém pudesse ver algum lugar para ela ficar, para poder tratar dela, das feridas. A assistente social correu atrás e foi aí que a Prefeitura decidiu mandar a ambulância pegar ela para ir para o hospital”, contou. “Trato dela como se fosse minha mãe. Ela gosta muito de leite moça. Hoje ela não tinha leite. Fui buscar no Centro Espírita”.

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Apesar das dificuldades, amor prevalece entre mãe e filho (Foto: Luiz Torres/DL)

Ao sair da prisão, Nicolaos foi ver a mãe, que estava internada no Pronto-socorro Central. Dona Janette havia recebido alta, mas o filho pediu que eles ficassem com ela mais um dia até que ele arrumasse uma cama adequada para colocá-la (a idosa dormia em um estrado com um colchão no chão). “Eles não quiseram ficar. Disseram que do jeito que ela entrou tinha que sair. De novo foi a entidade e assistente social que nos ajudou. Arrumaram a cama. Mal acabou de montar e a ambulância já estava aqui com ela. Achei um descaso. A gente que é pobre é tratado como lixo”, desabafou.

Sem saber o que fazer em relação à mãe, Nicolaos novamente procurou a Centro de Referência e Assistência Social (Creas) que fica próximo de sua casa, na esperança de encontrar uma vaga em uma casa de repouso ou que ela tivesse acesso a um serviço de cuidadores, mas não obteve sucesso. “Disseram que eu tenho que esperar. Que tem gente na frente. Que gente com a nossa situação tem de monte esperando”, disse. O órgão fornece apenas fraldas para dona Janette, que não conta com atendimento de fisioterapeutas e acompanhamento médico domiciliar.

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Apesar de todas as dificuldades, a Reportagem identificou que há muito amor entre os dois. Dona Janette, que a todo tempo olha para o filho com ternura, passa o dia na cama em frente a uma televisão que já está com problemas. O quarto onde vivem é simples, porém limpo e organizado. “Não quero abandonar a minha mãe. Eu apenas preciso trabalhar e ela precisa de cuidados que eu não posso dar. O que aparecer de trabalho eu vou. Já pensei em fazer uma besteira, mas penso nela. Procurei ajuda, mas ninguém me vê. Já pedi pelo amor de Deus que ele faça alguma coisa por nós”, disse Nicolaos emocionado.

Centro Espírita

O apoio que Nicolaos e dona Janette precisavam veio do Centro Espírita de Caridade Dr. Luiz Monteiro de Barros. A assistente social Aline Salinas, que trabalha na entidade, buscou auxílio para o atendimento da idosa nos dias em que o filho esteve detido.

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“Ficamos sabendo da história dela por meio de um dos diretores. Fomos (eu e a assistente social voluntária) até o quarto onde eles vivem e encontramos a situação. Passamos a orientá-lo de que forma tratar a mãe e a buscar os direitos nos locais certos. Conseguimos doações de fraldas, lençol, comida e produtos de higiene”, contou Aline.

No dia em que foi acionada pela vizinha de Nicolaos para buscar auxílio do serviço social da Prefeitura, Aline relatou que encontrou muitas dificuldades. “Liguei no Creas e ninguém atendeu, pois já passava das 17h30. Liguei no 4º Distrito Policial e expliquei a situação. O agente policial falou que não poderia fazer nada que o caso se encaixava no Estatuto Social e necessitava de assistente. Orientou a ligar na PM para que uma viatura fosse ao local. A PM informou que não poderia fazer nada, pois não era caso de polícia e disse para ligar na Guarda Municipal. Fui até o posto da GCM e eles disseram que teria de ligar na Urgência Social. Após muita insistência eles enviaram uma equipe”.

No dia seguinte, vizinhos informaram Aline que a idosa não havia sido removida para o hospital, mesmo após ser verificada que a mesma se encontrava com várias feridas. “Liguei no Conselho Municipal do Idoso e expliquei a situação. Não sei se foi a minha ligação ou se a visita dos agentes fez com que uma ambulância do Samu fosse buscá-la para encaminhar ao pronto-socorro. O caso dela é de internação em uma casa de repouso. São apenas os dois. Não tem uma terceira pessoa. Ela precisa de cuidadores e o filho não tem condições de pagar para poder trabalhar. Na minha visão é melhor que ela seja recolhida a uma instituição de permanência”, afirmou a assistente social.

A instituição onde Aline trabalha não recebe ajuda de órgãos do governo e é mantida com a doação de colaboradores. A entidade atua com população de rua e moradores da região do Mercado Municipal. Além do atendimento e encaminhamento social, o Centro oferece durante a semana, em dias alternados, cerca de 200 cafés da manhã e janta. “Toda doação é bem-vinda”, disse João Augusto, colaborador da instituição.

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Doações para a família de dona Janette e também para a instituição podem ser encaminhadas para a sede da entidade, que fica na Rua Silva Jardim, 1. Os telefones de contato são (13) 3223-5635 e 3223-1638. 

Prefeitura não informa sobre casa de repouso

O Diário do Litoral entrou em contato com a Prefeitura de Santos para entender o caso de dona Janette e o serviço social voltado para a população idosa no Município. A Redação questionou o número de pessoas na lista de espera para a vaga em casas de repouso, bem como os locais voltados para esse tipo de atendimento na Cidade. No entanto, a Administração Municipal não forneceu essas informações.

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Em resposta, a Prefeitura de Santos, por meio da Secretaria de Assistência Social informou que, em situações de emergência devem ser acionados a Delegacia do Idoso ou o socorro médico, conforme a necessidade de cada caso.

A Delegacia do Idoso fica na Avenida São Francisco, 136, sala 112, telefone 3228-6491, e funciona apenas de segunda a sexta-feira, das 9 às 19h.

Com relação ao caso de dona Janette, a Prefeitura informou que a munícipe foi  atendida pela primeira vez no Creas, em maio, o último atendimento foi em 14 de julho (terça-feira) e que a família continua sendo acompanhada. 

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A Secretaria de Saúde também foi consultada e afirmou que a paciente foi encaminhada para a Seção de Atendimento Domiciliar (Seadome), e que a mesma já está cadastrada no Seas. 

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