Cacique (esq.) Ronildo e vice-cacique Gilson (dir.) de Paranapuã / Rodrigo Montaldi/DL
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O preto significa luto eterno. O vermelho sangue e coragem. Com as duas cores pintadas no rosto, Ronildo Amandios, 37 anos, cacique da aldeia Paranapuã, localizada em São Vicente, revela o sentimento dos índios neste dia 19 de abril. A luta pela demarcação de terras, o combate ao preconceito, a afirmação da cultura e a lembrança dos ancestrais mortos são as bandeiras desta data que, para eles, não é de comemoração, mas de manifestação e resistência.
“Ser indígena no Brasil hoje é uma luta diária. Sofremos todos os tipos de discriminação. Na cidade somos mal vistos. Questionam porque andamos vestidos. Acham que índio tem que andar pelado. Não conhecem a nossa cultura. Temos as nossas falas, as nossas rezas, a nossa culinária, a nossa forma de interagir. O povo indígena quer ter a posse de um lugar desfrutável, um lugar que é nosso por direito. A luta pela demarcação é constante”, afirmou Amandios.
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A entrevista é realizada no interior da Casa de Reza de Paranapuã. Dois índios dedilham um violão e entoam timidamente uma canção. Um curumim – criança indígena – corre e interage com o repórter fotográfico. Feito de barro e pau, o local é utilizado pelos membros da aldeia para reuniões e rituais.
“Aqui é uma casa de orações como uma igreja para nós. A gente se reúne para realizar batizados, dar nome aos recém-nascidos, tomar decisões para o futuro. Aqui nos orientamos com o pajé e orientamos o nossos jovens para valorizar a nossa cultura. Pedimos a Deus, que a gente não vê mas sabe que existe, força e saúde”, destacou o cacique.
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Ronildo conta que se tornou cacique no início deste ano. Nasceu em uma aldeia do Paraná e ainda criança migrou com os pais para comunidades indígenas de São Paulo até chegar em Paranapuã, formada há 13 anos por guaranis m’byas no interior do Parque Estadual Xixová-Japuí. A migração é uma característica dos índios guaranis.
“Alguém tem uma visão e fala do lugar. O pajé vê se é propício. Junta todo o pessoal para visitar o local. No caso de Paranapuã quem teve a visão foi a mulher do meu tio, o pajé. Ela sonhou com esses dois rios que têm lá atrás. No meio desse rio era o lugar para morar”, contou.
A aldeia Paranapuã foi formada em 2004. Um grupo composto por mais de 60 índios guaranis das aldeias de Itanhaém, Peruíbe e Mongaguá ocuparam a área conhecida como ‘Praia das Vacas’.
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A informação, na época, e de que eles haviam sido trazidos pela Prefeitura para participar da Encenação da Fundação da Vila de São Vicente, espetáculo que acontece anualmente nas areias da praia do Gonzaguinha, durante as comemorações do aniversário da Cidade. A ocupação foi questionada pelo Governo do Estado. No ano final de 2015, a justiça determinou a reintegração de posse do local. O processo ainda tramita na Justiça.
“Sabemos que talvez nem vejamos essa demarcação, mas lutamos pelos nossos filhos”, disse Amandios.
Avanços
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Devido à ação de reintegração de posse poucos projetos podem ser realizados na aldeia. Sem meios de subsistência como plantações, os indígenas sobrevivem com o apoio de grupos e da comunidade. Também é comum a ida de mulheres e crianças de Paranapuã para o Centro da cidade, onde comercializam artesanato. Após os protestos realizados no início do ano passado, motivados pela determinação da justiça, Amandios disse que o relacionamento com o poder público melhorou. Eles também receberam mais auxílio.
“Melhorou o nosso relacionamento com o pessoal do parque. Recebemos a ajuda do pessoal da universidade (Unifesp). Eles estão nos ajudando a cultivar uma horta. Serão três horas”, destacou o líder indígena. A pequena plantação já conta com mudas de milho e de mandioca. Atualmente residem em Paranapuã 20 famílias – aproximadamente 100 pessoas.
Jovem
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O vice-cacique da aldeia, Gilson Samuel dos Santos (Verá Mirim – Pequeno Relâmpago em guarani), participa da conversa na Casa de Rezas. O jovem de 29 anos é tímido. Concorda com o que o companheiro de aldeia diz e reforça o sentimento de luta da data.
“A gente já nasce índio com a obrigação de defender a cultura dos nossos parentes. Não temos o que comemorar nessa data. É de manifestação e mobilização nacional, principalmente por causa das demarcações. Aqui dependemos muito do pessoal de fora, da assistência deles para ter uma estrutura melhor”, destacou Verá Mirim.
Atualmente residem em Paranapuã 20 famílias – aproximadamente 100 pessoas. A entrada de não indígenas na aldeia é restrita e controlada por meio de uma portaria da Fundação Florestal que funciona 24 horas por dia.
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Jogos
A partir de hoje a Paranapuã conta com uma programação especial. Alunos de uma escola municipal de ensino infantil farão uma visitação. No sábado (22) e domingo (23) será realizado o II Jogos Indígenas da comunidade. O evento, que acontece das 8h às 17h contará com a participação de aldeias da região e será aberto ao público. A entrada é um quilo alimento na perecível.
A Paranapuã fica na Avenida Engenheiro Saturnino de Brito s/nº, no Parque Prainha.
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No Dia do Índio, os guaranis da aldeia Paranapuã dizem que a data é de manifestação e resistência, momento de lembrar dos antepassados e lutar pela terra