Sancionada em 12 de agosto de 2010, a legislação federal estabelece a chamada logística reversa / Renan Lousada/DL
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Biólogo e ativista ambiental há 25 anos, André Fabiano de Castro Vicente considera que o descumprimento da Lei 12.305/10 é uma das razões para a alarmante poluição por microplásticos nos rios e praias da Região Metropolitana da Baixada Santista.
Professor de Meio Ambiente na Escola Técnica Estadual de Cubatão, Vicente considera que a 'fatura' por este passivo ambiental deve ser cobrada, sim, dos moradores das palafitas sobre os rios dos Bugres, São Jorge e Casqueiro.
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Mas, o ativista ambiental ressalta que navios e indústrias também são responsáveis por essa contaminação, assim como os usuários das praias. Dos dez locais mais poluídos por microplásticos no mundo, seis estão na Baixada Santista.
Já o segundo rio mais poluído do mundo, é o divide as cidades de Santos e São Vicente.
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A contaminação desses corpos d'água em Santos, Cubatão e Guarujá foi revelada pela revista científica Marine Pollution Bulletin, após estudo conduzido pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares e pelo Instituto Ecofaxina.
Batizada como Política Nacional de Resíduos Sólidos, a Lei 12.305/10 estabelece a figura do poluidor-pagador e a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos à base de plástico.
Sancionada em 12 de agosto de 2010, a legislação federal estabelece a chamada logística reversa.
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Ou seja, fabricantes de embalagens plásticas e empresas que comercializam seus produtos com esse tipo de material passaram a ter responsabilidade pelo recolhimento desses poluentes a fim de evitar que sejam descartados no ambiente.
Em seu artigo 7º, a Política Nacional de Resíduos Sólidos prega a "articulação entre as diferentes esferas do poder público, e destas com o setor empresarial, com vistas à cooperação técnica e financeira para a gestão integrada de resíduos sólidos" a fim de viabilizar a "disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos".
Mas, conforme revelado ao Diário do Litoral por fontes ligadas à maior produtora de polietileno do Brasil, apenas o equivalente a 0,035% dessa matéria-prima usada na produção de embalagens plásticas acaba removida do ambiente para reciclagem após o uso.
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A unidade instalada há 70 anos no Polo Industrial de Cubatão remunera moradores de comunidades do município com kits de alimentação, higiene e limpeza a cada cota de recicláveis entregue à empresa.
Em 2024, só essa planta industrial produziu 135 mil toneladas de polietileno em Cubatão.
Mas, só 48 toneladas foram removidas do ambiente, o que rendeu 834 kits aos moradores das comunidades que participaram do programa de recolhimento do plástico dos mangues e vias públicas da Cidade.
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Com a experiência de quem atua como voluntário em ações de limpeza de praias desde o ano 2000, Vicente reforça que não é justo para culpar apenas os moradores das palafitas pela quantidade de microplásticos nos cursos d´água da região.
"Todo mundo tem um pouco de culpa. E temos de responsabilizar todos os setores e não só um. Lógico que a indústria contamina muito mais, apesar da preocupação que eles têm com o ESG, de minimizar o impacto que causam", salienta o ativista ambiental.
Porém, ainda não é possível quantificar a contribuição de cada setor: "O cidadão comum também (tem culpa) porque descarta resíduo na praia. Quando o poder público passa limpando, o microplástico fica na areia porque ninguém peneira a areia", destaca o professor.
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"Tem várias fontes, desde plástico jogado nas ruas e (no mar) pelos navios. Tem descarte de embalagens, brinquedos, garrafas e outros produtos, além do escape de embalagens nos aterros", completa Vicente.
Também biólogo, Fábio Araújo Nunes, o professor Fabião, cita a "falta de uma usina de beneficiamento de plástico reciclável" na Região Metropolitana como um fator decisivo para o acúmulo de embalagens nos cursos d´água estudados pelo Ipen e pelo Ecofaxina.
Mestre em Sustentabilidade e ex-secretário de Meio Ambiente de Santos, Fabião alerta para os riscos à saúde pública oferecidos por esses "poluentes emergentes".
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Com a experiência de quem atua como voluntário em ações de limpeza de praias desde o ano 2000, Vicente reforça que até a escolha do vestuário pode interferir na poluição por microplásticos.
Segundo o professor da ETEC de Cubatão, roupas feitas à base do poliéster derivado de petróleo se desintegram com o tempo e acabam contaminando águas, peixes e crustáceos.
"Você lava roupa e gera microplástico. Ele vai para o esgoto e daí acaba no mar. Os animais filtradores vão absorver e, consequentemente, os animais que se alimentam deles. É a cadeia alimentar", relata Vicente.
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Nesse caso, a opção por peças feitas com algodão e outras fibras vegetais contribui para evitar a degradação do Planeta.
Além dos animais aquáticos, pesquisas científicas recentes apontam a presença de microplásticos em cérebros humanos.
Estudo desenvolvido na Universidade do Novo México, nos Estados Unidos, revelou que "no tecido cerebral de indivíduos com idades entre 45 ou 50 anos foram encontrados 4,8 mil microgramas por grama, ou 0,5% em peso".
Comparado às amostras de cérebro de autópsias realizadas em 2016, o volume encontrado em 2024 foi cerca de 50% maior. "Isso significaria que nossos cérebros hoje são 99,5% cérebro e o restante é plástico", revelou a pesquisa.
E as partículas de até 5 milímetros de plástico entram no corpo humano através de alimentos contaminados.
Mas, outro estudo conduzido pela Faculdade de Medicina da USP em parceria com a Universidade Livre de Berlim e apoio do Laboratório Nacional de Luz Synchronton, em Campinas, concluiu que a inalação do polipropileno através do bulbo olfatório também preocupa.
Divulgado em setembro de 2024, ele analisou o cérebro de 15 pessoas falecidas que moravam em São Paulo. Em oito deles foram encontrados resíduos como fibras e partículas de plástico.
Estas pessoas não tinham contato com a indústria de embalagens, garrafas e pneus, que liberam partículas inaladas ao respirarmos.