LITORAL NORTE

Governo de SP manda famílias voltarem para casas condenadas em São Sebastião

Três meses depois das chuvas que deixaram 65 mortos no litoral norte paulista, famílias retornam para casas que já tiveram ordem de demolição

TULIO KRUSE - Folhapress

Publicado em 18/05/2023 às 14:49

Atualizado em 18/05/2023 às 14:51

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Três meses depois das chuvas que deixaram 65 mortos no litoral norte paulista, famílias de São Sebastião estão sendo mandadas de volta para casas que já tiveram ordem de demolição e que seguem em risco. / Divulgação/Defesa Civil de São Sebastião

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Três meses depois das chuvas que deixaram 65 mortos no litoral norte paulista, famílias de São Sebastião estão sendo mandadas de volta para casas que já tiveram ordem de demolição e que seguem em risco.

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O retorno ao morro do Pantanal, próximo à praia de Juquehy, ocorre após essas famílias desabrigadas perderem a hospedagem em pousadas da região e ficarem sem opção de moradia. A Defesa Civil do município e o Governo de São Paulo deram aval à reocupação, alterando o status de ao menos sete casas que já haviam sido interditadas permanentemente, dizendo agora que elas podem ser habitadas.

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Algumas construções foram afetadas pelos deslizamentos e têm grandes rachaduras nas paredes, portas fora do lugar e furos nos telhados. Há famílias com medo de permanecer ali e em busca de alternativas, mas sem sucesso.

No dia da tragédia, três pessoas morreram no morro do Pantanal sob os escombros de uma casa soterrada pela lama -um casal e a filha de 2 anos. Os moradores que voltaram ao bairro estão a poucos metros dessa área, até hoje tomada pelo barro que desceu da encosta.

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Os primeiros relatórios da Defesa Civil municipal, feitos nos dias 14 e 15 de março, determinavam a interdição definitiva das casas e o desmonte dos imóveis "para evitar acidentes, salvaguardar vidas e prevenir danos ao patrimônio".

Em 18 e 20 de abril, contudo, uma equipe de dois geólogos e um engenheiro ambiental do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), vinculado à Secretaria Estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação, analisou as condições de sete casas no morro. Eles foram acompanhados por uma agente da Defesa Civil do município, e todas as casas vistoriadas foram liberadas para reocupação.

O relatório ressalta que ainda há risco de deslizamentos de terra nessa área. Diz, ainda, que para permanecer ali é necessário se cadastrar no alerta de desastres do governo estadual, seguir recomendações de segurança e, em caso de perigo, dirigir-se aos abrigos mais próximos.

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Por isso, o documento sugere que sejam feitas obras para mitigar os riscos às construções, como muros de contenção, drenagem e melhorias nas moradias. Nada disso, porém, foi feito nos últimos três meses, e os técnicos do IPT não descartam a remoção definitiva dos moradores, como havia sido decidido inicialmente.

Em nota, o governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) afirma que vistorias feitas no fim de abril pelo IPT, IPA (Instituto de Pesquisas Ambientais) e pela Defesa Civil de São Sebastião serviram para confirmar ou retificar laudos que haviam sido feitos anteriormente.

"Alguns imóveis foram reclassificados, e os moradores orientados sobre os procedimentos que deveriam adotar, inclusive solicitar novos laudos à Defesa Civil do município em caso de dúvidas", diz a nota.

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TREINAMENTO PARA FUGA

Cinco desses moradores estão numa área do morro onde só é possível chegar por uma escada de 101 degraus, o que dificulta a saída durante uma emergência. Entre eles há uma criança de 6 anos e dois homens com mais de 60.

A Defesa Civil diz que fará treinamentos de fuga com quem está no local, o que revoltou alguns moradores.

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"Eu disse ao rapaz da Defesa Civil, quando ele falou em treinamento para descer o morro: 'convido você e o prefeito Felipe Augusto [PSDB] para passar uma noite lá, para vocês verem o que a gente passa'", contou a faxineira Liliane Olga dos Santos, 36. Ela conta que nesta semana teve que dormir três noites na área mais isolada do morro.

Sobre o treinamento, o governo afirma que se trata de procedimento de segurança adotado com moradores de todas as residências em áreas classificadas como aptas a reocupação.

Durante uma reunião entre moradores e técnicos da Defesa Civil, há cerca de uma semana, algumas famílias se recusaram a assinar documentos reconhecendo a segurança das construções.

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De acordo com o governo, a assinatura desses termos não significa que as famílias concordaram com os laudos que liberaram as casas, uma vez que os moradores foram orientados a pedir novas vistorias.

FIM DA ESTADIA EM POUSADAS

Surpreendidos pelo fim da estadia nas pousadas, Liliane Santos e alguns vizinhos tiveram que ficar no morro do Pantanal até conseguirem outra opção -ficaram ali o menor tempo possível, com medo de que as paredes viessem abaixo.

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A faxineira conseguiu um auxílio-aluguel, mas o pagamento só será efetivado no fim de maio. Com pressa para entrar na casa alugada, ela pediu dinheiro emprestado a amigos para pagar os dias a mais e conseguir se mudar nesta semana.

O auxílio-aluguel, porém, é uma opção inviável para muitos desabrigados. É preciso encontrar um proprietário disposto a alugar a casa e a documentação do imóvel precisa estar em ordem. E o mais difícil de tudo é encontrar um aluguel a preço acessível.

A empregada doméstica Simone dos Santos, 27, voltou a morar numa das partes baixas do morro Pantanal, mas diz não se sentir segura. A casa do vizinho, com parede colada à sua, recebeu ordem de demolição por causa do risco de desabar.

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Como a casa vizinha está numa parte mais alta do morro, ela tem medo de que um deslizamento derrube as duas construções de uma vez. Mas diz que não teve outra opção a não ser voltar.

"Na pousada eles disseram que teríamos que sair até dia 15 [de maio] e [para] quem não saísse eles iam chamar a polícia", contou. "Eu tenho medo de fechar o olho à noite."

Os moradores do morro do Pantanal também relatam que precisam comprar galões de água para tomar banho. O que sai das torneiras tem cor de terra e cheiro ruim, pois os barracos eram abastecidos por um riacho para onde até hoje escorre a lama que desceu dos morros.

As famílias aguardam por apartamentos da CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano), mas as unidades devem ficar prontas em cerca de três anos.

A ajudante de obras Noêmia Regina da Silva, 28, e a filha dela estão dormindo desde segunda-feira (15) na área mais isolada, conhecida como "escadão". É uma das casas mais altas do morro e está entre duas cicatrizes dos deslizamentos. O chão do banheiro está rachado e entortou.

"Não tem condições de trazer minha filha de seis anos para morar comigo", ela lamenta.

De acordo com o governo, as famílias que hoje residem nessas áreas serão cadastradas para os próximos empreendimentos da CDHU em São Sebastião.

"No momento, o Governo de SP está construindo 704 imóveis para os afetados pelas fortes chuvas de fevereiro, com previsão de entrega no segundo semestre de 2023", diz a nota enviada à reportagem.

A Prefeitura de São Sebastião, por sua vez, diz que acompanha a situação de moradores de áreas de risco desde antes da catástrofe. E reafirma que os primeiros laudos eram provisórios.

"Com a tragédia de fevereiro, surgiram novas áreas de risco, onde antes não havia", diz a prefeitura. "Foram 693 cicatrizes em morros que indicam áreas de escorregamento, em áreas habitadas e não habitadas. Um novo levantamento será feito tão logo seja finalizado o abrigamento de todas as famílias que perderam suas moradias, sendo essas as primeiras as serem transferidas para as moradias já em construção, em caráter emergencial, pelo governo do estado."

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