Cotidiano

Cartunista compara atentado a jornal francês ao ataque de 11 de setembro

Víctor Henrique Woitschach teme que o atentado ao jornal de Paris provoque mudanças no comportamento e no trabalho dos cartunistas

Pedro Henrique Fonseca

Publicado em 08/01/2015 às 17:33

Compartilhe:

Compartilhe no WhatsApp Compartilhe no Facebook Compartilhe no Twitter Compartilhe por E-mail

Continua depois da publicidade

O cartunista Víctor Henrique Woitschach, conhecido profissionalmente como Ique, comparou o atentado ao jornal Charlie Hebdo, em Paris, ontem (7), ao ataque às torres gêmeas do World Trade Center, em Nova York, no dia 11 de setembro de 2001.

Faça parte do grupo do Diário no WhatsApp e Telegram.
Mantenha-se bem informado.

“Foi o 11 de setembro dos cartunistas, porque a dor que a gente sente, eu senti como se o tiro tivesse passado muito perto, porque é a realidade. Como disse um amigo meu. eles são da minha espécie. É o meu trabalho. Eu me senti como um cartunista dentro da redação, e gente entrado e atirando a esmo”, airmou.

Ique teme que o atentado ao jornal de Paris provoque mudanças no comportamento e no trabalho dos cartunistas. “O externo já vai mudar, a segurança vai mudar, uma série de coisas vai mudar, mas o mais importante é que a gente não mude o interno. Para que a gente não comece o trabalho já com autocensura, com medo e com receio, porque este era o objetivo deles. Quando eles foram até aquele ponto, matar aqueles cartunistas, daquela publicação, eles ampliaram muito o alcance do medo que queriam colocar no mundo inteiro.”

O cartunista brasileiro lembrou que depois do ato terrorista às torres gêmeas houve uma série de mudanças no mundo, desde alterações no protocolo da aviação e no movimento dos aeroportos até o dia a dia das pessoas. “Descobrimos que aquilo era possível. Até então não passava na cabeça de ninguém que aquilo era possível”, disse Ique. Para ele, o ataque ao Charlie Hebdo foi um tiro na liberdade de expressão e no direito de ir e vir. Para ele, o momento é de união para não ceder ao medo.

Continua depois da publicidade

Segundo Ique, tratar o caso como uma questão religiosa é minimizar um problema internacional. “É político, é do terror, é do medo e está afetando o que a humanidade conseguiu às custas de muito esforço, que é o estado democrático e a liberdade de expressão. A decisão do jornal de lançar uma nova edição na próxima semana é uma forma de mostrar que os responsáveis pelo ataque vão ter que se expor novamente. “É uma resposta à altura e contra esse medo que se instalou em todo o mundo.”

12 pessoas morreram no atentado em Paris (Foto: Associated Press)

Para o professor do Instituto de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC) Marcio Scalércio, o episódio vai provocar radicalização tanto entre extremistas islâmicos quanto nas correntes políticas de direita. Ele chamou a atenção também para a tentativa de aproveitamento oportunista do atentado, especialmente das forças políticas europeias contrárias à imigração e disse que a islamofobia pode se intensificar. “Do mesmo modo que os radicais islâmicos apoiam ações como essa, com o objetivo de aproveitar-se delas para radicalizar e tornar a força a única linha de resolução de problemas, a extrema direita vai pelo mesmo caminho. O setor ultraconservador vai pela mesma linha.”

Continua depois da publicidade

De acordo com Ique, neste momento, há uma certa unanimidade no que se refere ao repúdio ao ataque, mas, posteriormente, é possível que setores mais intransigentes aproveitem-se da situação. Scalércio destacou que os líderes islâmicos têm procurado condenar o ataque. “Os líderes consequentes e razoáveis não têm feito outra coisa desde ontem a não ser condenar o atentado. Houve inclusive pronunciamento da Universidade Islâmica do Cairo, que é a mais importante do mundo, condenando veementemente o atentado, mas essa condenação é uma espécie de autodefesa, já prevendo o que vem por aí.”

Em nota divulgada ontem, a Associação dos Cartunistas do Brasil (ACB) condenou o episódio e lembrou que o jornal francês já tinha sofrido um atentado em novembro de 2011. A nota ressalta que, ainda que tenham sido desrespeitados preceitos religiosos, não se justifica a violência provocada. “Repudiamos sempre todo e qualquer modo de violência à liberdade de expressão. O desenhista é justamente o artista que busca a defesa dos mais fracos e oprimidos desde que as charges começaram, há 200 anos. A palavra charge é francesa e significa carga, por ser sempre uma carga crítica aos governos e dogmas que mancham os direitos humanos e a livre expressão. Os desenhistas mortos foram críticos em suas vidas em relação aos governos que oprimem povos de países do Terceiro Mundo”, destacou a nota.

Mais Sugestões

Conteúdos Recomendados

©2025 Diário do Litoral. Todos os Direitos Reservados.

Software