Cotidiano

Anteprojeto prevê extinção de quatro categorias de trabalhadores nos portos

Proposta foi elaborada por juristas e consultores, sem levar em consideração argumentos dos trabalhadores, o que motiva paralisação de advertência nos portos hoje

Nilson Regalado

Publicado em 22/10/2024 às 06:15

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Anteprojeto patrocinado Furtado de Oliveira e por uma comissão formada por mais 14 juristas será formalmente apresentado na Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (23) / Nair Bueno/DL

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O relator da proposta legislativa que prevê a “revisão” do conjunto de leis que regula as relações nos portos brasileiros precisou de 25 páginas para justificar a introdução de medidas que ferem a organização dos trabalhadores portuários brasileiros. Em seu voto a favor da “atualização” das relações nos portos, o relator do texto, desembargador Celso Ricardo Peel Furtado de Oliveira, esbanja clichês do neoliberalismo, como “eficiência”, “produtividade” e “livre concorrência”. E cita mantras da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico e o Fórum Econômico Mundial. Mas, Furtado de Oliveira ignora por completo o pleito e as sugestões de entidades ligadas aos trabalhadores portuários, manifestadas em cartas, ofícios, e-mails e durante audiências públicas da comissão que elaborou o anteprojeto.

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Em nenhuma das 25 páginas de seu voto, o relator menciona qualquer preocupação com a renda dos portuários ou o impacto do eventual descarte desses profissionais, por conta da suposta “modernização” do trabalho nos portos.

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O desembargador também não faz qualquer projeção sobre os reflexos das mudanças na economia de cidades como Santos.

Apesar disso, o desembargador fala em valorizar a relação “porto-cidade”, com o incentivo à promoção de “eventos culturais e turísticos que valorizem a relação histórica entre o porto e a cidade”.

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O anteprojeto patrocinado Furtado de Oliveira e por uma comissão formada por mais 14 juristas será formalmente apresentado na Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (23). O trabalho da comissão, batizada de Ceportos, foi encomendado pelo presidente da Casa, o deputado federal por Alagoas Arthur Lira (PP) e começou em dezembro de 2023.

“A revisão do arcabouço legal pode contribuir para a atração de investimentos e a geração de empregos no setor”, resume o relator com mais clichê neoliberal. “A liberdade econômica também deve se constituir em um princípio a nortear esta nova lei dos portos”, completa o desembargador.

Essas conclusões, porém, não agradaram os trabalhadores. E motivaram a deflagração de uma greve de advertência agendada para hoje nos portos do País. A paralisação começa às 7 horas e termina às 19 horas e foi decidida conjuntamente por três federações nacionais de trabalhadores portuários.

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Extinção

O anteprojeto patrocinado por Furtado de Oliveira e por Lira também prevê o fim de categorias como conferentes de carga e descarga, consertadores, trabalhadores de bloco e vigias portuários. Todos esses profissionais passariam a ser estivadores ou trabalhadores de capatazia, com o fim de seus respectivos sindicatos.

Mais: sob o argumento da “valorização do trabalho humano” preconizado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), a proposta a ser formalmente apresentada amanhã na Câmara dos Deputados autoriza a terceirização nos portos brasileiros. Isso significa que os operadores portuários poderão se eximir de responsabilidades com os trabalhadores que atuem em seus terminais.

“É uma aberração atrás da outra. O que eles querem é aviltar a renda dos trabalhadores. E sem nenhum diálogo”, critica Bruno José dos Santos, presidente do Sindicato dos Estivadores de Santos, São Vicente, Guarujá e Cubatão.

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“Não somos contra a modernização, nem contra novos investimentos nos portos, mas temos que garantir o direito dos trabalhadores”, protesta o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Portuários de Santos (Sintraport), Miro Machado.

Qualificação

Mas, o relatório estipula que “trabalhador portuário é aquele que, possuindo qualificação profissional certificada ao exercício da profissão, desenvolve sua atividade profissional no trabalho portuário, no porto público”.

E prevê que “a qualificação profissional para o exercício do trabalho portuário deverá ser atestada por certificado expedido pelo Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte”, o Senat.

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Apesar dessa consideração o próprio relator admite que apenas 4% do que é arrecadado anualmente para qualificação dos portuários acaba, efetivamente, se prestando a esse fim.

Uníssona

Antes de concluir a redação do anteprojeto, o Ceportos realizou seis audiências públicas, em que se colheu sugestões e subsídios para a elaboração do relatório final.

Esses encontros aconteceram na Associação Comercial de Santos, em Itajaí, no Rio de Janeiro, em Recife, em Vitória e em Brasília. A Comissão também organizou, na Câmara dos Deputados, uma audiência para receber avaliações dos consultores, também juristas.

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Além disso, a Comissão organizou o Simpósio “Os novos horizontes do marco legal portuário no Brasil”, no Tribunal Superior do Trabalho, em Brasília.

Mas, predominaram as vozes de representantes das entidades patronais, que ocuparam praticamente todos os espaços de fala nessas ocasiões.

“A garantia de que os trabalhadores sejam tratados com dignidade e respeito certamente contribuirá para a melhoria da motivação e da produtividade, reduzirá os riscos inerentes à atividade e aumentará a confiança dos investidores, resultando em maiores oportunidades para todos os integrantes do setor”, teorizou Furtado de Oliveira em seu relatório.

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O Ceportos foi presidido pelo ministro Douglas Alencar Rodrigues, do Tribunal Superior do Trabalho. 

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