Olhar Filosófico

Paulo Nietzsche e Frederico Freire

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Para o filósofo alemão Friedrich Nietzsche, seu país e sua época (século XIX, Alemanha, um país central da europa) não souberam utilizar e, muito menos, compreender a história, em parte, podemos dizer o mesmo em relação à crítica do filósofo Paulo Freire à história na educação de seu tempo (século XX, Brasil, um país “periférico” sulamericano).

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Trago à mente essa comparação, pois, durante anos, pesquiso, estudo (e até já publiquei) sobre esses dois pensadores tão díspares em suas ideias centrais, vistos e lidos por muitos como opostos em tudo, mas que sempre os vi muito próximos em suas críticas.

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Nietzsche nos diz que o conhecimento à maneira historicista de então, “oficial” da época, (supondo leis idealizadas de um processo histórico determinante), mata a ação afirmativa das subjetividades. Entendendo o ato de conhecer como produção subjetiva de sentidos vitais dentro de condicionantes históricos, tal ato precisaria ser despertado por mentes autônomas e críticas, subjetividades livres. Em seu “Assim falou Zaratustra”, nosso filósofo diz: “Agora prossigo só, meus discípulos! Ide vós também agora, sozinhos! Assim desejo eu. Em verdade, eu vos aconselho: afastai-vos de mim e defendei-vos de Zaratustra! Mais ainda: envergonhai-vos dele! Talvez vos tenha enganado. O homem do conhecimento deve não apenas poder amar seus inimigos, mas também odiar seus amigos. Retribuímos mal a um professor, se continuamos apenas alunos. E por que não quereis arrancar louros da minha coroa? Vós me venerais; mas se um dia vossa veneração tombar? Cuidai para que não vos esmague uma estátua!”

Ainda que de forma mais ampla, além da compreensão egóica da subjetividade aos moldes nietzscheanos, Paulo Freire também entende o conhecimento como um ato produzido por condicionantes e não determinantes históricos, e, também sendo estimulado a partir de uma curiosidade epistemológica nascida da compreensão da fala do outro dentro do mistério do mundo e das contradições sociais. Freire, igualmente, condena  o conhecimento “oficial” de  sua época, ideologicamente “acalmada” pelo cultivo na educação da idéia de “neutralidade técnica”, fruto de uma curiosidade ingênua: “(...) transformar a experiência educativa em puro treinamento técnico é amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no exercício educativo: o seu caráter formador.”

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Para Nietzsche, a saída para a liberdade seria a sabedoria da arte (da possibilidade de outros modos, belos, de revelação de sentidos da realidade), pois, só a arte (enquanto visão instintiva-racional-subjetiva, nessa ordem) “consegue dobrar aqueles pensamentos de repugnância sobre o horrível ou sobre o absurdo da existência, em representações com as quais se consegue viver.”, e, nos lembrando das palavras de Paulo Freire: “A necessária promoção da ingenuidade à criticidade não pode ou não deve ser feita à distância de uma rigorosa formação ética ao lado sempre da estética. Decência e boniteza de mãos dadas.”

Para se obter esse comportamento artístico, faz-se necessário para ambos pensadores, mais notadamente à relevância dada por Nietzsche à estética, encarar a história como um desafio instigador, um palco (ao estilo trágico na arte grega) onde o indivíduo realiza sua própria razão de ser, seu destino forjado e afirmado sobre as possibilidades do presente. No fundo, especificamente no pensamento do filósofo alemão, isso revelaria a indispensável maneira de se viver a-historicamente, ou historicizando o próprio estar sendo da subjetividade nas contradições da história, segundo Freire.

A história não é, e não pode ser, uma mera continuação quantitativa de todas as coisas, um mero conjunto de fatos (essas interpretações ideológicas). Para Paulo Freire, todos somos chamados ao fazer histórico, na dialética da construção/desconstrução e suas novas possibilidades de sínteses em formas estruturantes de realização/efetivação de uma coletividade mais harmônica e da própria natureza conosco irmanada. 

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Já Nietzsche, por sua vez, nos alerta para que não limitemos a história e suas significações a ideias generalizantes. O seu valor está em variar com cada espírito livre, sujeito de si, um tema já gasto, à posição de símbolo compreensivo: “Mas para isso é necessário, antes de mais, uma poderosa faculdade poética, o poder criador de planar por cima do real, de mergulhar com amor nos dados empíricos, de criar imagens novas, conformes com tipos dados; é necessária objetividade, mas só no que ela tem de positivo, porque com muita freqüência a objetividade é apenas uma palavra.”

E complementando com Paulo Freire: “Significa reconhecer que somos seres condicionados mas não determinados. Reconhecer que a história é tempo de possibilidade e não de determinismo, que o futuro, permita- me reiterar, é problemático e não inexorável.”

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