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Sempre que busco pensar o nada, me vem à mente a ideia do amor. É um fato onipresente em minhas reflexões, o nada e, automaticamente, o amor.
Não tem explicação. É uma regra (ou vício mental). É um conceito que me persegue. E não por ser romântico. Faço até oposição ao romantismo. Respeito sua lírica, mas abomino sua quietude submissa, sua “lei” de querer validar como positiva a entrega da nossa vontade e autonomia a um outro. Como se fôssemos necessariamente corpos e almas siamesas. Essa ilusão que cria a ideia do amor romântico me incomoda. Somos, sim, almas que querem, corpos que desejam. Quem, o quê e como são outros quinhentos.
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Em suma, é por culpa do amor que não consigo “desligar” meu cérebro.
E as explicações vêm sempre prontas junto às ideias dos grandes filósofos, poetas, teólogos e escritores que leio. Assim, busco e nunca encontro, uma análise própria conclusiva. Dou chutes e palpites.
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Sigo a ideia do amor como quem escala uma montanha já sabendo que a visão final será sempre a de um abismo. Que nos cerca. E que nos observa de volta, como diria Nietzsche.
O amor é uma ação. Sua base é o desejo, o querer. E o querer é insaciável. Enquanto houver corpo e mente, o desejo está lá. O querer manda e aponta as direções.
É nesse sentido que entendo as artimanhas inerentes à ação amorosa. Como um processo natural, biológico, material e nada contemplativo. Sua atividade primeira, que é a tentativa de resposta à busca por uma completude inexistente, é autorreferente (está somente no desejo do amante) e, pouco a pouco, conforme avança à consciência desse fato, chega à compreensão de pensar a totalidade do mundo como uma correlação interminável de desejos e vontades em corpos que tateiam somente o chão onde pisam. Amor é compaixão pela débil condição humana.
Assim, amor também é unidade. Um conjunto de vidas presas a um universo e pautadas pela angústia de ter que escolher (e renunciar) entre as expectativas das satisfações possíveis.
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Amor é ação de reflexão e descoberta. Nossa identidade nasce da possibilidade de um espelho (o outro) que reflita um encontro. Penso em mim e só me encontro no outro. O amor, portanto, acontece necessitando do outro para saciar a necessidade de buscar a mim.
Mas aonde esse outro se encontra afinal? Na proximidade! O amor é geográfico. Amo quem está perto. Amor é aprendizado de convivência e tolerância. Todo ato de amor começa pela geografia da proximidade. Aquela história de que as almas gêmeas estão prontas e jogadas no tempo para se encontrar é ridícula.
Namoramos, criamos amizades e afetos, casamos etc., com quem está próximo espacialmente. Por isso o amor é um encontro de possibilidades materiais. Aprendizado imerso nas condições do encontro real. Do face a face. O direito de ir e vir deveria ser visto como o direito humano elementar da ação amorosa.
Tenho a possibilidade de amar a minha família pelo fato de trocarmos afetos e cuidados pela proximidade na qual fomos jogados gratuitamente e não por uma obrigação moral inserida em nosso coração. Por isso, julgo mais importante, livre e autônomo o processo de escolha das amizades. E tudo está a depender do cuidado e afeto dispensados entre as partes. A proximidade junta (amor), mas também separa (repulsa).
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Por fim, o amor também é geométrico, embora não exato. Definitivamente, não somos como peças de lego, mas ainda que condicionados em nossas formas elementares (no tempo, no espaço, nos gêneros do nosso corpo) formamo-nos maleáveis e em constante mutação de um quebra-cabeças chamado possibilidade. O amor é afirmação.
Amar é ser só. Só ser.
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