Olhar Filosófico
Continua depois da publicidade
A grande questão que ainda parece nos assombrar é bastante elementar e já esteve presente desde os gregos a Comenius e Rousseau, de Piaget a Freire e Nóvoa: Afinal, o que é um professor?
Se não nos ativermos ainda outra vez a essa questão corremos o risco de repetirmos fórmulas mágicas e teorias que se encaixam mais numa lógica abstrata do que numa práxis do dia a dia do fenômeno de fazer-se professor. Gostaria apenas de ressaltar três variáveis complementares (não hierárquicas) que a nosso ver compõe a ação que constitui a identidade docente:
Continua depois da publicidade
Primeiro, é inegável que carisma e talento fazem parte de todo e qualquer função social, ou seja, não é um dom (dádiva, presente dos deuses) que faz a profissão docente ser o que é, mas o talento. Talento significa, antes de tudo, o desenvolvimento de habilidades inerentes ao sujeito dentro de sua cultura, possibilidades e limitações. Forjado historicamente, o talento do professor é fazer-se entender em assuntos específicos com fim de inculcar a pessoas, em instituição específica, parcela do conhecimento acumulado da humanidade. Carisma é, por sua vez, a capacidade de atrair para si e, através disso, convencer (e convencer-se) do conhecimento que se tem apreendido;
Segundo, a regulamentação social de profissão. Se não tivermos de forma clara e específica que ser professor é, antes de tudo, ser, primeiro, um trabalhador entre trabalhadores e, segundo, um trabalhador que vende conhecimento apreendido e estratégias didáticas (de memorização e reflexão) com o intuito exclusivo de propiciar a continuidade do ‘saber mundial’ através de empenho próprio, o ensino, dentro das possibilidades de fato das instituições socialmente construídas e consolidadas. A profissão regulamentada constitui também a identidade do trabalhador, uma vez que, a partir dela, saberá ele como agir e como proceder para que sua ação atinja a meta pretendida e se desenvolva em conformidade com sua classe social na esfera do trabalho;
Continua depois da publicidade
Terceiro, e não menos importante, é o imprescindível reconhecimento social, qual seja, o de disseminador específico da cultura sistematizada a todo o seu povo. Não queremos, com isso, significar que o professor detenha um saber incomum ou mesmo genial, mas, tão somente, que ele, em sua função específica, precisa ser reconhecido como o trabalhador que vende ideias acumuladas da humanidade a fim de que tomem corpo e se tornem práticas do dia a dia da cultura e do conhecimento. Ser reconhecido, portanto, é ter na sociedade da qual faz-se parte, o aval para exercer e dar sentido ao seu ofício.
Assim, portanto, podemos dizer que ser professor não é uma situação ontológica-vocacional, mas, antes, uma ação específica (física-psíquica; material) de ensinar conteúdo sistematizado e acumulado, com carisma e talento em instituição social consolidada e distintiva e, ainda, a partir de um reconhecimento social de profissional específico a desempenhar seu papel histórico de disseminador das ideias que dão algum sentido à humanidade dentro de seus mais diversos tempos e espaços.
O professor é a mão-de-obra que pode somente reproduzir mais mão-de-obra para uma classe opressora num sistema opressor, mas, também, a mão-de-obra que pode, ainda que oprimida, promover a reflexão sobre a libertação das amarras de qualquer sistema e ideologia vigentes. Nem tudo é a escola, nem tudo o professor, todavia, sem escola e professor, como construir a identidade e soberania de um povo?
Continua depois da publicidade