Olhar Filosófico

Definir pelo que não se é

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Uma das formas e fundamentos que mais utilizei até aqui para falar e escrever sobre filosofia (e em minhas leituras teológicas também), era a da negatividade. Não tem nada a ver com ser negativo ou pensar negativamente sobre todas as coisas, mas, sim, tentar esgotar o entendimento de um tema utilizando uma análise que diz e evidencia, sobre o que uma coisa vista, sentida, pensada, primeiramente, não é.

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Desde Aristóteles, o filósofo grego pilar fundante da lógica ocidental, certos princípios são tomados como dogmas para a afirmação de um postulado, frase ou ação. Ou seja, na busca de uma afirmação daquilo que se faz, diz ou crê, a mente humana teria princípios lógicos inatos e capazes de assegurar tal feito.

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Aristóteles trabalhava com a ideia fixa de que os três pilares (ou princípios, como ficaram conhecidos) da sua lógica formal seriam o de identidade, correspondente à capacidade exata de reafirmação da identidade de uma palavra, conceito ou ideia; o de não-contradição, correspondente ao entendimento, que já disporíamos, de não permitir racionalmente que algo identificado como o seu oposto contraditório seja possível e válido; e o princípio do terceiro excluído, isto é, só há a possibilidade de um predicado estar ligado a um sujeito de uma maneira e não de outra, em se tratando de uma mesma ideia de afirmação e qualificação de um sujeito (da frase) e sua ação derivada específica, não havendo outro modo de entendimento, ou seja, uma terceira possibilidade é excluída, daí a nominação terceiro excluído.

Pois bem, levando em consideração a grandeza e a postura lógica dada pelo nosso amigo grego nascido em Estagira, tudo, logicamente possível e viável, só podia caminhar sempre num sentido único, o da busca positiva daquilo que se pretende afirmar e validar na realidade, incluído nesse conceito, o pensado, o crido e o visto. Todavia, também, é inegável a utilização de tais princípios lógicos aristotélicos para a comprovação daquilo que negativamente se aplicaria nas afirmações, ou seja, a percepção das contradições a serem desmanteladas pela razão sensata dos filósofos atentos a tudo e todos. Mas, como disse, o viés de Aristóteles é o da afirmação daquilo que se pretende defender como certo e, por que não, óbvio. Daquilo que intitulamos em última instância de conhecimento, válido e verdadeiro.

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Fato é que essa atitude promoveu e promove sempre a ideia de que, primeiro, existe uma organização inerente à razão humana e ela sempre pende para a positivação da realidade, para a comprovação da realidade.

Frente a isso, poderia aqui lembrar e debater com base nos conceitos de seu mestre e antecessor Platão. Mas, desse outro gigante grego, só gostaria de reafirmar uma das mais interessantes definições de conhecimento expressa em seu (difícil) diálogo intitulado Teeteto, e dita pelo próprio: “... O SABER É OPINIÃO VERDADEIRA ACOMPANHADA DE EXPLICAÇÃO e que a opinião carente de explicação se encontra à margem do saber. E aquilo de que não há explicação não é susceptível de se saber (...) sendo, pelo contrário, cognoscível aquilo de que há explicação.” (Teeteto / Platão. 3ª ed. - Lisboa : Fundação Calouste Gulbenkian, 2010. pg.302)

Em que pese Platão e Aristóteles sustentarem basicamente o mesmo, a verdade é sempre uma correspondência entre “o visto” e “o proferido”, a abertura que nos dá Platão, é enorme, inclusive para apontarmos incongruências em suas próprias definições e buscas da verdade.

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Mas, como dizia lá no início do artigo, há muito que me guio primeiramente pela filosofia negativa, que acompanho e roubo de diversas filósofas e filósofos ao longo da história, essa necessidade de primeiro tentar demonstrar o que o pensado, o sentido ou o visto podem não ser, antes de qualquer afirmação sobre esses mesmos fatos: pensado, sentido ou visto.

Com isso, creio que abrimos a possibilidade de permitirmos ao fato, coisa, pessoa, se mostrarem em parte da forma que talvez sejam de verdade ou o mais próximo disso. A negação com bom senso dentro de uma opinião embasada em dados coletivizados e interpretados segundo uma lógica (sempre histórica) do possível, mais do que do provável, sempre me soou como a alternativa inicial frente a todo e qualquer assunto, ideia ou ação. A via negativa amplia as possibilidades de definição e tem maior probabilidade de não incorrer nos erros daqueles que buscam, inicialmente, a afirmação e o perigoso “simplismo” nas identificações.

Por exemplo, já podemos sustentar com razoabilidade e dados objetivos descritos historicamente, as negativas daquilo que é Messias: não é bom, não é humanista, não é religioso, não é virtuoso, não é legalista, não é solidário, enfim, daí, se quiserem acrescentar com “não será nem presidente”, a possibilidade da cadeia de elos lógicos estaria aberta e a cadeia de fatos comprobatórios também. À cadeia se guia o processo, é melhor já ir se acostumando. 

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