Olhar Filosófico
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No Brasil em que vivemos, real, visceral e desigual, impera desde o início da invasão portuguesa, uma estrutura de privilégios voltada ao euro-americanismo do homem branco e seus descendentes.
Não me refiro aqui simplesmente a nossa já consagrada quintessência da ignorância (com toques de mau-caratismo envergonhado), o vira-latismo nativo dos adoradores das caravelas ou da delicada “Little Boy” do tio Sam. Falo, principalmente, da organização mais profunda da sociedade que herdamos e que nos coube viver.
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Do século XVI ao XIX, a partir da escravidão dos negros e indígenas, foi gerado o núcleo da divisão social e econômica do Brasil de agora.
Da monarquia totalitária ao atual estado neoliberal autoritário, a mão de obra negra se firmou como produto e referência para o crescimento e mantenimento da pobreza em nosso país.
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Esse caldo de ultraje ético, é o berço da famigerada “cota do privilégio”, ou como lhe chamam os seus amantes mais desavergonhados, “meritocracia”.
Se levarmos em consideração os últimos apontamentos do IBGE que demonstraram um número ainda maior da já majoritária população negra e parda no Brasil (56%), o que explica, dentre tantas situações bárbaras e ultrajantes para qualquer povo que se diga humanizado, a seguinte situação: 75% das pessoas em situação de pobreza no nosso território são negras; mais de 66% da população carcerária no Brasil é composta de negros; 77% das vítimas de homicídio no país são negras, tudo isso e muito mais, ao mesmo tempo que menos de 40% da juventude negra ocupam os bancos universitários em nossas instituições de ensino.
O escravismo como organização econômica alimentado pela moral perversa do racismo, é a face a ser extirpada da nossa (e de qualquer outra) sociedade que se queira chamar de humana.
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As políticas públicas afirmativas, tão necessárias, são ainda só uma garantia jurídica frágil e facilmente manipulada aos desejos dos manipuladores da desigualdade. Precisamos garantir o formal e o material nessas ações. Como nos ensinou o grande frei dominicano Bartolomeu de Las Casas (1474-1566) ao defender os índios contra os invasores espanhóis (seus conterrâneos): "juntar el hecho con el Derecho" (juntar o feito com o direito): estar alerta aos fatos e as práticas e compará-los ao direito posto e se preciso for (e sempre será), refazê-lo em favor dos mais vulneráveis e vilipendiados.
Há dez anos da implementação da lei (12.711) das cotas sócio-raciais, é chegada a hora do debate previsto no corpo do projeto para um balanço, ajustes, desistência ou prosseguimento.
As cotas representaram um aumento de quase 400% do número de negros no ensino superior, e, embora seja uma conquista a se comemorar, os números atuais que relembrei e comparei acima, demonstram que é ainda muito pouco para começarmos a falar institucionalmente sério sobre oportunidades mais igualitárias para todos.
O que ainda prevalece a olhos vistos, é a predominância das cotas do privilégio, essas insistem em manter ocupados os bancos dos cursos de medicina e de outros tantos cursos das universidades públicas a partir de sistemas de ingresso feito sob medida para a casa grande orgulhosa de si e de seus infinitos méritos oriundos da sua rapinagem histórica.
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Os inimigos da humanidade são muitos e se travestem, na maioria vezes, de seres humanos sorridentes e efusivos. Falam em democracia racial e dizem, sem ruborizar, que sempre tiveram amigos negros, conhecem negros esforçados que com mérito próprio viraram grandes pessoas e que em suas casas, a preta empregada é como se fosse da família. Não se engane, são todos racistas!
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