Olhar Filosófico

A árvore da escola que tinha nome de árvore

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A árvore da escola, que tinha nome de árvore e ensinava sobre ecologia e árvores, foi cortada.

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Foi cortada a árvore da escola que tinha nome de árvore e os passarinhos foram cortados ao meio e dos seus ninhos caíam seus filhotes ainda sem penas e morriam no chão estéril e branco do prédio vizinho porque não sabiam voar ou gritar ou bicar ou virar bomba igual kamikaze.

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A escola com nome de árvore foi quem pediu para cortar a árvore e cortar ao meio os passarinhos, lá no ambiente mesmo onde se ensinava ecologia e amor ao meio do ambiente. No lugar da grama e da terra que rodeavam a imensa árvore de frutos, microrganismos e pássaros, a escola de nome de árvore forrou com tapete sintético de falsa-grama para facilitar o ensinamento das aulas de ciências e respeito aos animais, às flores e plantas de todas as espécies.

Mas tinha um detalhe estranho nesse ato de cortar a árvore nessa escola com nome de natureza bruta. Por via das dúvidas, as crianças estavam de férias, talvez nadando em Miami ou Orlando e acariciando focas e peixes presos em tanques, para ensinar aos pequenos que a natureza é domável e linda para ser usada como um ladrilho branco e brilhante nos prédios rodeados de vidro com caminhonetes ocupando dois lugares por vaga e achando que Dubai é um luxo e é aqui.

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As crianças estavam fora da escola da árvore sem árvore e isso facilitou o corte sem recorte para Instagram de algum desavisado que ainda ousasse querer abraçar a árvore ferida de morte e acampar na cabeça de um qualquer secretário de meio ambiente daquela cidade de mar, rios, muitos risos e árvores.

A escola da árvore, com nome de árvore e já sem ela, jaz em cimento e cal e muitos homens trabalhando para mantê-la intacta, pintada e hermética à natureza para ensinar ecologia e paixão aos aluninhos e aluninhas quando o ano pedagógico der o sinal da sua graça. Assim se aprende que o progresso é um azulejo retrô pintado a mão com cara de cozinha colonial portuguesa.

A iluminação da escola da árvore sem os pássaros e bichos e tudo já não é mais a mesma. Agora os cocurutos das crianças queimarão ao relento mesmo embaixo de grandes lonas com desenhos enormes e coloridos de toda a fauna e flora nacional. Tem até ararinha azul no teto de lona para a criançada brincar no chão de cimento e lajota da escolinha carcomida pelo avanço dos tablets e de toda tecnologia virtual. 

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A professora se prepara para, uma vez estando na escola da árvore (mas já sem ela), levar cartolinas e aplicativos multicolores com animais e vídeos demonstrando como um lagarto se reproduz ou um sabiá alça voo; e mostrando no visor o que é uma joaninha ou uma taturana andando livres e soltas. E as crianças da escola sem árvore, olhando para professora, dirão OH! OH! Em seguida, relatarão sobre suas férias em meio a jogos eletrônicos e brincadeiras de violência controlada. A professora, por fim, irá para casa tranquila e com a certeza de que sua tarefa está cumprida e que na primeira oportunidade se inscreverá no Greenpeace e fará uma alimentação balanceada com algas japonesas e barrinha de cereais.

Nos telhados em volta da escola sem árvore, os pássaros se acumulam aos montes esperando o momento certo para sua natureza retomar tudo que lhes é de direito. E tudo outra vez será tomado por mato e vida que a gente evita falar. 

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