Olhar Filosófico

2023: Por uma educação filosófica

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Se tivesse que escolher uma única causa para gastar mais minha vida, seria a devoção à educação e mais especificamente a luta pela filosofia! Defendo isso como o bom senso do qual me alimento e sustento como condição elementar para aconstrução de um mundo possível e melhor para todos, não só nas ideias, livres e plurais, mas também no espaço onde todos caibam, vivam sem fome e com as condições de casa e teto asseguradas para decidirem ser o que quiserem.

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Assim sendo, entendo que é somente pensando a educação como processo de humanização constante e crescente das gerações que aconscientização filosófica da educação, desde a sua concepção curricular, deverá sempre ganhar mais corpo, ser discutida e reavaliada também na perspectiva do tempo presente. Partindo daí, portanto, podemos nos questionar se a disciplina de filosofia serviria, de fato, à formação do cidadão global de hoje. E o que podemos constatar até aqui como fundamental para a dissipação de dúvidas e a construção de uma qualidade cada vez maior em educação no Brasil, é que a discussão sobre o modelo de educação é da mesma importância e concomitante à discussão a respeito do currículoescolar, o qual, por sua vez, tem a mesma importância e é concomitante à discussão a respeito da posição social da escola na sociedade e, inclusive, de novo, por razões lógicas, é da mesma importância e concomitante à discussão pela permanência e relevância dos fundamentos epistemológicos que garantiriam a disciplina de filosofia no Ensino Médio. Como diz o renomado estudioso espanhol da educação, Gimeno Sacristán, “Se considerarmos que a educação deve continuar a propor modelos de ser humano e de sociedade, sem se limitar a se adaptar às demandas do momento (o que não significa desconsiderá-las), não podemos ficar à espera do que nos seja demandado do exterior e reclamado pelo mercado, mas devemos defender determinada atitude comprometida com um projeto democraticamente elaborado, que sirva a um modelo flexível de indivíduo e sociedade.”

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A sugestão do professor Sacristán deixa pistas importantes a respeito de como a própria filosofia enquanto disciplina pode se desenvolver inserida no currículo, isto é, somente numa concepção democrática e segundo a ideia de identidades flexíveis dos indivíduos sociais (suas lógicas, seus gêneros, suas culturas e, por que não, seus temores), poderemos iniciar de fato um processo educacional formativo cada vez mais aberto e abrangente; numa frase, salvaguardar a igualdade, as condições e a oportunidade de formação das diferenças. É neste ponto que o currículo escolar (que tanto já falei nesta coluna) ganha ressignificações, ou seja, não pode mais ser visto como uma grade de conhecimentos dados por especialistas que ensinam tudo a todos e, sequer, mostram ao maior interessado, o aluno-cidadão, o processo de conquista e garantias de tal e tal conhecimento, mas tão somente resultados que, em sua maioria, são repassados como absolutos. O professor, outrossim, peça motriz da engrenagem, precisa saber algo mais do que o conjunto de conhecimentos que ensina, precisa conhecer didáticas, debater e rever o processo educativo, relacionar como um elo necessário escola e culturageral e esta à cultura pessoal do aluno, reavaliar o papel da escola e o seu papel na escola e o próprio processo de qualificação e sua profissão. Somente assim, a ideia de currículo escolar expande-se e torna-se, então, uma rede, valorizada a interdisciplinaridade, desfragmentada a própria ideia de produção de conhecimento histórico e coletivo, permitindo fundamentar-se cada vez mais no avanço de formação social integral do indivíduo. Neste processo, o aluno deve estar movido muito mais pelos seus desejos de entender e ressignificar o mundo e a si mesmo do que memorizar conteúdos que o levem, tão somente, a passar de etapa como num jogo de videogame, mas, e é claro, sem estar na escolha do jogo e no controle do joystick. 

À disciplina de Filosofia cabe, então, fazer com que o aluno racionalize e construa sua própria identidade argumentativa sobre o seu próprio processo de formação num mundo cercado de significantes e significados. Assim, seu fundamento epistemológico está evidenciado como um saber de formação político-cultural, circunscrito em tempos e espaços, onde o trabalho conceitual permeia o processo para se atingir a autonomia do indivíduo frente aos condicionamentos ideológicos de seu meio social. 

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Se a disciplina de História conta, reconta e problematiza a marca humana por entre os espaços durante certos períodos de tempo, se a Física lida com o tempo, com a matéria e o espaço para situar o homem no Universo ora palpável, ora observável, e se as Artes lidam com as mais diversas expressões do indivíduo por meio de sua criatividade e intuição, a Filosofia trata do conceito, da ideia, do que é o Homem como ser complexo, misterioso e, principalmente, pensante, intuitivo... Afinal, como o humano pode pensar-se a ponto de organizar uma razão humanizadora/educativa, de construir uma razoabilidade que estruture seus discursos, das Artes às Ciências? Qual a finalidade de pensarmos tanto, apoiados em tantas ideias e conceitos se estes mudam conforme o tempo e o espaço e podem, ainda assim, mudar-nos o sentido da existência? Eis o passo de gigante na filosofia!

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