José Renato Nalini
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Fui apresentado à obra de José Saramago pela registradora Maria Helena Leonel Gandolfo, no início dos anos oitenta. Era exatamente o momento em que o português descobria a literatura, depois de ter sido mecânico, servidor de cartório e funcionário público.
Era impactante a leitura de “Levantado do chão” e “Jangada de Pedra”, sem pontuação e que só se entendia bem quando lido em voz alta. Mas difícil deixar de se apaixonar por “Memorial do Convento”, “O Evangelho segundo Jesus Cristo”, “Todos os nomes”, “Intermitências sobre a morte”, e tantos outros. Quem lê Saramago converte-se em seu ardoroso fã. É o que acontece com tantos brasileiros letrados.
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Tive o privilégio de conhecê-lo pessoalmente, em casa de Lygia Fagundes Telles, sua amiga. Conversou comigo singelamente, como pessoa já há muito conhecida. Autografou-me o exemplar de “Todos os nomes”.
Gostei dos seus “Diários de Lanzarote”, uma crônica praticamente diária de sua vida nesse arquipélago. Corajoso, não hesitava em atacar aquilo em que não acreditava. Irônico, sarcástico, tratou a política partidária como ela deve ser tratada.
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Jorge Amado e ele brincavam a respeito do Nobel de Literatura. Cada qual apostando no outro como o primeiro a merecer a honra sueca. A cada ano frustrado – o mais próximo foi 1994 – eles tinham uma sacada própria para explicar o motivo pelo qual o português é língua morta para a Academia sueca. Saramago disse a Jorge Amado: “O dinheiro é deles e eles fazem o que quiserem. Mas que nos faria bem, isso é verdade...”
Em 1995, Saramago ganhou o Prêmio Camões, que também contemplou Lygia pouco depois. E em 1998, o ambicionado Nobel. O único, até o momento, para o nosso vernáculo. Bem que Lygia o merecia também.
Saramago, assim como Lygia, renegou sua obra inicial: “Terra do pecado”, escrita em 1947. Morreu em 2010 e em 16 de novembro de 2022 completaria cem anos. Cada vez mais vivo. Quem estiver em Lisboa não pode deixar de visitar o memorial construído pela Fundação José Saramago. Além de toda a vida reconstituída, há filmes com inúmeras falas do escritor, que adorava seus leitores. Permanecia à disposição deles. Um dia, aqui no Brasil, comentou: “Eles ainda vão me matar de tanto amor!”.
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* José Renato Nalini é Reitor da UNIREGISTRAL, docente da Pós-graduação da UNINOVE e Presidente da ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS – 2021-2022.
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