José Renato Nalini
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Sou voz isolada no pleito por uma profunda reformulação dos concursos públicos para as carreiras jurídicas. Eles refletem a inadequação da imensa maioria dos cursos de direito, cuja preocupação, nos cinco longos anos de duração, é fazer o aluno decorar legislação, doutrina e jurisprudência. Um acervo enciclopédico, cuja memorização se tornou inócua a partir da revolução nas tecnologias da informação e comunicação. Todo esse conhecimento está disponível a um clique num dos instrumentos eletrônicos postos à disposição de qualquer pessoa.
Um ensino “decoreba” oferece um concurso também “decoreba”. Daí a previsibilidade dos certames que se realizam por todo o Brasil, oferecendo vagas no Judiciário, no Ministério Público, nas Defensorias, nas Procuradorias, nas Polícias e nas delegações extrajudiciais. Todos os concursos são realizados sob o mesmo esquema: escolhe-se uma comissão avaliadora “ad hoc”, não pela experiência em RH ou recrutamento, desprovida de prática em psicologia do trabalho, e a ela se entrega a renovação dos quadros estatais das carreiras mais bem pagas da República.
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Isso faz surgir a “indústria dos concursos”: os cursinhos de preparação, as empresas especializadas em propiciar ao concursando as viagens, tipo “conheça o Brasil prestando concurso”, as empresas que se encarregam da realização da primeira prova, cuja abertura já significa bom ingresso de dinheiro. Há quem sustente que já se abriu concurso desnecessário, só para “fazer caixa”.
Vejo com certa esperança o trâmite no Senado do Projeto de Lei 252/2003, que propõe a modernização dos concursos no âmbito federal, mas que é uma semente para Estados e municípios. Que sirva de inspiração para os responsáveis pelos cargos tão disputados das profissões jurídicas estatais. Já é tempo de raciocinar como a empresa privada: tem headhunters para o recrutamento. É que a iniciativa dos particulares não tem por si o Erário a responder pelos equívocos não intencionalmente praticados pelas Instituições, quando entregam cargo público vitalício a pessoas não vocacionadas. Mas detentoras de boa memória, pois conhecem o suficiente da lei, da doutrina e da produção dos Tribunais.
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A lucratividade da “indústria dos recursos” oporá resistência a qualquer mudança. A “aura sacra fames” ainda sustenta muitos aparatos.
* José Renato Nalini é Diretor-Geral da UNIREGISTRAL, docente da Pós-graduação da UNINOVE e Secretário-Geral da Academia Paulista de Letras.
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