'Quando o paciente retoma as histórias trágicas que viveu no passado, a gente trabalha no sentido de que ele pode deixar essas histórias no passado' / Rodrigo Montaldi/DL
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De acordo com um relatório publicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em fevereiro deste ano, o Brasil tem a maior taxa de pessoas com transtornos de ansiedade do mundo. No total, 18,6 milhões de brasileiros viviam com algum transtorno de ansiedade em 2015.
O país lidera na América Latina e no mundo, com 9,3% da população com algum tipo de transtorno de ansiedade. A taxa é três vezes superior à média mundial.
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Em busca de amenizar o problema, a medicina tradicional e alternativa oferecem diversos tratamentos. Neste Papo de Domingo, uma conversa com o neuropsicólogo Davidson Lemela, que trabalha com a tese de que vidas passadas podem influenciar os sintomas atuais apresentados pelos pacientes com ansiedade.
DL - O que é ansiedade?
Davidson Lemela - Ansiedade é quando você antecipa situações, exacerba, potencializa. Por exemplo, você trabalha em uma empresa e fica sabendo que haverá cortes. O ansioso crônico já se vê na rua. Ele não espera acontecer, ele sofre antes.
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DL - Existem tipos de ansiedade?
Davidson - Sim, existe a ansiedade crônica e a ansiedade por demanda. A ansiedade crônica é aquela em que a pessoa fica constantemente em estado de ansiedade mesmo que não exista nada real na vida dela acontecendo. A ansiedade por demanda é natural, aparece quando, por exemplo, você vai fazer um concurso público ou uma entrevista de emprego. Afinal, em maior ou menor grau, todos somos ansiosos.
DL – A ansiedade pode ser considerada uma doença? E o que ela causa no corpo físico?
Davidson - A ansiedade não é uma patologia, tanto que a gente chama de distúrbio de ansiedade generalizada, mas ela provoca uma série de patologias, por exemplo: transtorno do pânico, transtorno obsessivo compulsivo, ataques fóbicos, dores no corpo, entre outros. Quando ela surge, derrama alguns hormônios na corrente sanguínea, como a adrenalina e o cortisol, que roubam toda a energia do sistema imunológico. Agora, você imagina repetir isso hoje, daqui dois dias, a semana que vem... A pessoa acaba ficando doente. A gastrite é o primeiro sinal, depois vêm outras patologias mais graves. Quando a ansiedade aparece, o cérebro lê essas informações como se fosse uma situação de perigo, como se a qualquer momento fosse aparecer uma fera, como acontecia de fato com os homens da caverna. É uma resposta neurológica que a gente chama de Eixo HPA, Hipotálamo-Pituitária-Adrenal. Esse mecanismo nos protege contra uma situação real de stress.
DL – Você diz em sua palestra que a ansiedade é um atributo de pessoas inteligentes. Por quê?
Davidson - Existe uma pesquisa de um neurocientista americano chamado Robert Sapolsky que queria descobrir por que os babuínos têm gastrite. Ele observou o comportamento desses animais e percebeu que eles têm práticas muito parecidas com as dos humanos. Em paralelo, estudou também a vida das zebras. Durante o estudo, ele percebeu que a única preocupação da zebra é quando ela vê um leão aparecer. O corpo dela só reage quando, de fato, existe um fator preocupante. Assim que o predador vai embora, ela volta a comer porque não tem habilidade cognitiva para imaginar que o leão pode vir de novo. Nós não, nós temos essa capacidade de antecipar uma situação e isso é uma habilidade de cérebros inteligentes. Dessa pesquisa, Sapolsky escreveu o livro “Por Que As Zebras Não Têm Úlceras?”.
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DL – Como funciona a terapia que liga a ansiedade às vidas passadas?
Davidson - A ansiedade está ligada à culpa, mas à culpa inconsciente, não àquela que surge quando nos arrependemos de alguma coisa. O problema detectado é com essa culpa que a gente não lembra e que está ligada aos erros graves cometidos em outras vidas, mas que por uma série de motivos particulares, acabamos transformando o que seria um arrependimento numa culpa, ou seja, não nos perdoamos. As pessoas não estão se perdoando.
DL – Quais as características de uma pessoa ansiosa por que sente culpa?
Davidson - Sabe aquelas pessoas que estão sempre arrumando alguma coisa, perfeccionistas, que tem sempre que ajudar todo mundo? Aquelas que não podem errar e quando erram sofrem muito, não conseguem dizer não? Então, a culpa faz com que a pessoa sinta que precisa agradar a todos e ser bom, sempre. É difícil viver assim, porque nos somos imperfeitos.
DL – Como é realizada as sessões de terapia reencarnacionista?
Davidson - A terapia de vidas passadas leva o paciente a descobrir as coisas erradas que fez e que não se lembra mais, mas que inconscientemente não se perdoa. Ele vai descobrindo as histórias e vai aprendendo a se perdoar.
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DL – Você pode relatar um caso de algum paciente que tenha achado em alguma vida passada, os motivos da sua ansiedade atual?
Davidson - Tive uma paciente que era médica e tinha em torno 55 anos. Ela apresentava todos os sintomas de uma pessoa muito ansiosa. Perguntei se ela sentia a vida travada, aí ela me contou que há alguns anos, quis fazer um curso no Hospital das Clínicas que era dado por um médico reconhecido da área. Para realizar o curso era preciso enviar um currículo para análise. Ela enviou, mas já achando que iam jogá-lo fora. Um mês depois, ela foi chamada par uma entrevista com o médico. Quando entrou na sala, ele estava folheando o currículo dela e perguntou: “Com esse currículo, por que a sua vida não decolou?”. Pessoas culpadas se sabotam. Ao fazer regressões apareceram histórias e uma delas a deixou muito amargurada pelo arrependimento que sentiu pelo que tinha feito. Ela tinha sido, em uma vida anterior, um senhor de escravos e viu a forma como os tratava, quantos ela tinha matado e o ódio que eles ficaram dela. Depois dessa vida, ela sofreu perseguições no mundo espiritual e foi socorrida depois de muito tempo. Brotou dentro dela um arrependimento muito grande e esse sentimento acabou se transformando em culpa. Ela não se perdoava, apesar de ter escolhido uma profissão que ajuda as pessoas, inconscientemente, sentia que não merecia ser feliz.
DL – Há cura para a culpa?
Davidson - Praticar o autoperdão. Quando o paciente retoma as histórias trágicas que viveu no passado, a gente trabalha no sentido de que ele pode deixar essas histórias no passado, no lugar em que elas devem ficar. Não trazer histórias de 300 anos atrás para atrapalhar o presente.
DL – O arrependimento ajuda a replanejar a vida?
Davidson - Não, o arrependimento é o que acontece primeiro porque quando ele acontece é quando a gente reconhece o dano que causou ao outro. O arrependimento é bom, mas a culpa é ruim porque a culpa é quando você não se perdoa. Então, a grande sacada é a pessoa transformar a culpa em responsabilidade. Você é responsável? Então se perdoe.
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DL – São receitados remédios durante o tratamento da ansiedade?
Davidson - Como psicólogo não posso receitar nenhuma medicação, pelo contrário, a gente trabalha no sentido do paciente ir largando a medicação.